JUIZ PARCIAL – STF nega recurso da PGR e mantém suspeição de Moro no caso Banestado
Os embargos de declaração servem para sanar eventuais omissões, contradições, obscuridades ou erros materiais, não para rediscutir matéria já julgada. O entendimento é da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que negou recurso da Procuradoria-Geral da República contra decisão que considerou o ex-juiz Sergio Moro parcial ao julgar o doleiro Paulo Roberto Krug.
O doleiro foi condenado no caso Banestado, que mirou um suposto esquema de evasão de divisas bilionário entre 1996 e 2002, e foi responsável por tornar Moro famoso já em 2003.
Segundo a PGR, não ficaram demonstrados durante o julgamento da 2ª Turma as evidenciais que comprovariam a parcialidade de Moro ao julgar Krug. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes, relator do recurso, discordou. Ele foi seguido por todos os integrantes do colegiado.
“No inteiro teor do acórdão há a indicação precisa, com a devida motivação, dos elementos que embasaram os votos proferidos a ponto de indicar a parcialidade do julgador e o prejuízo ocasionado”, disse Gilmar.
Ainda segundo o ministro, “a PGR deseja apenas rediscutir matéria decidida pela Turma […] para dar aos presentes embargos de declaração características dos embargos de divergência”.
Suspeição
O julgamento que considerou Moro parcial ocorreu em agosto do ano passado. Ao apreciar o caso, a 2ª Turma entendeu que o ex-juiz violou a imparcialidade que é exigida dos magistrados.
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram pela suspeição. Luiz Edson Fachin e Cármen Lúcia entenderam que não ficou demonstrada a parcialidade do ex-juiz de Curitiba. Empatado, o caso foi resolvido com a aplicação do in dubio pro reo.
Para Gilmar e Lewandowski, Moro pulou o balcão e se tornou acusador ao colher o depoimento do também doleiro Alberto Yousseff e juntar documentos aos autos depois das alegações finais da defesa.
Não faltaram críticas ao método de trabalho de Moro. Gilmar foi enfático e disse que o ex-juiz “atuou verdadeiramente como um parceiro do órgão de acusação na produção de provas que seriam posteriormente utilizadas nos autos da ação”.
“Esses indícios denotam que a atuação do juiz foi de fato além da mera verificação das condições de legalidade, regularidade e voluntariedade para a celebração de acordos, passando a confundir-se com a do próprio órgão acusador. O juiz efetivamente guiou e reforçou a tese acusatória com a direção do interrogatório”, afirmou Gilmar.
Ainda segundo ele, “resta evidente, portanto, a quebra da imparcialidade do juízo, o que finda por macular os atos decisórios por ele proferidos, já que ausente o elemento base de legitimidade da jurisdição em um estado democrático de direito”.
Sem citar a série de reportagens do The Intercept Brasil, conhecida como “vaza jato”, Lewandowski afirmou em seu voto que “coisas muito estranhas aconteceram em Curitiba, naquela Vara Federal, que acabaram vindo à lume e foram amplamente divulgadas pela imprensa”.
“Como se nota, a simples leitura das atas dos depoimentos revela, de forma indene de dúvidas, uma evidente atuação acusatória do julgador. Com efeito, verifica-se a proeminência da formulação de perguntas aos delatores as quais fogem completamente ao controle da legalidade e voluntariedade de eventual acordo de colaboração premiada. Todos nós conhecemos as técnicas de interrogação, se são neutras ou se buscam induzir o interrogado a ofertar algum resultado numa determinada direção”, prosseguiu.
Banestado
Foi no caso Banestado que Alberto Youssef tornou-se parceiro dos investigadores do Paraná: o doleiro fez acordo de delação premiada e entregou diversos concorrentes do mercado de venda ilegal de dólares. A partir das declarações e documentos apresentados por Youssef, os investigadores — procuradores da República e agentes da Polícia Federal reunidos na chamada força-tarefa CC-5 — acusaram diversas pessoas de evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
O caso que a 2ª Turma julgou é de um dos alvos da força-tarefa, o doleiro Paulo Roberto Krug. O caso foi levado ao STF pelo advogado Cal Garcia, com base em parecer feito pelo professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Geraldo Prado.
O julgamento havia sido iniciado em setembro de 2019, no Plenário virtual. No entanto, foi levado ao Plenário físico após o ministro Gilmar Mendes pedir vista.
A corrente de entendimento do relator, ministro Luiz Edson Fachin, foi que a participação de autoridade judicial na homologação do acordo de delação “não possui identidade com a hipótese de impedimento prevista aos casos de atuação prévia no processo como membro do Ministério Público ou autoridade policial”.
A oitiva dos colaboradores no juízo, disse Fachin, é uma tarefa “ínsita à própria homologação do acordo”, de forma que não pode configurar impedimento ou ser “equiparável às funções desempenhadas pelo Ministério Público ou pela autoridade policial, cujas atividades encontram-se intrinsecamente relacionadas à própria entabulação do acordo e à iniciativa probatória”.
O ministro votou para negar o recurso do doleiro, mantendo a compreensão de seu voto anterior, no qual ele criticava a “politização por que têm passado os esforços por mais eficiência na Justiça”.
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RHC 144.615
Tiago Angelo – Conjur