FISHING EXPEDITIONS – STF publica acórdão da 2ª Turma que tirou ação da Fecomercio das mãos de Bretas
Nesta quarta-feira (3/11), o Supremo Tribunal Federal publicou o acórdão de julgamento da 2ª Turma que declarou a incompetência da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro para julgar um processo envolvendo a Fecomercio do Rio de Janeiro. A decisão ainda anulou as buscas e apreensões promovidas, por determinação do juiz Marcelo Bretas, em 75 endereços ligados a advogados último ano.
Na ocasião, a maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, Gilmar Mendes, que destacou a inviolabilidade dos escritórios de advocacia e a impossibilidade de fishing expeditions — medidas extensas ou não relacionadas ao processo, com o objetivo de obter provas para fundamentar novas ações.
A decisão do STF já foi cumprida por Bretas, que em agosto enviou os autos à Justiça estadual do Rio. O juiz ainda determinou o levantamento dos bloqueios de bens e valores dos advogados, retidos a título de indenização por dano moral coletivo — o que, segundo o Supremo, não pode ser feito em ação penal. A Polícia Federal deve devolver todo o material apreendido nas buscas.
Histórico
A denúncia aceita por Bretas foi formulada com base na delação de Orlando Diniz, ex-presidente da Fecomercio-RJ. Preso duas vezes entre 2007 e 2011 por supostos desvios de verbas, ele vinha tentando emplacar uma delação por dois anos, até concordar em acusar advogados que estavam na mira da “lava jato” por defender clientes acusados de corrupção. Diniz ganhou a liberdade e o direito de ficar com cerca de US$ 250 mil depositados no exterior.
Como mostrou a ConJur, o Ministério Público Federal dirigiu as respostas de Orlando Diniz. Além disso, o então presidente da Confederação Nacional do Comércio, Antônio Oliveira Santos, estava em litígio com Diniz pelo controle da entidade. Santos era um grande apoiador das “10 medidas de combate à corrupção” e patrocinou inúmeras palestras do ex-juiz Sergio Moro e de procuradores da “lava jato”.
As buscas e apreensões tiveram início em setembro do último ano. A OAB ajuizou reclamação constitucional contra a investida de Bretas. Em outubro, Gilmar Mendes suspendeu liminarmente a decisão do juiz.
Entendimento do relator
Gilmar apresentou seu voto ainda em abril deste ano. Ele lembrou que a Fecomercio é uma entidade privada, e por isso deveria ser investigada pela Justiça Estadual, mesmo que receba recursos da União. Por isso, afastou a competência da Justiça Federal. De qualquer forma, o processo não poderia ser atraído por prevenção à vara de Bretas pela delação de Diniz, já que, segundo o STF, acordo de colaboração premiada não fixa competência.
Ainda segundo o ministro, os mandados de busca e apreensão foram genéricos e amplos, sem explicação sobre o que motivaria cada medida. Além disso, Bretas aceitou a denúncia contra parte dos alvos praticamente ao mesmo tempo em que ordenou o cumprimento dos mandados.
“Percebe-se que não houve a observância aos requisitos legais e nem às prerrogativas da advocacia, com a ampla deflagração de medidas que buscaram ‘pescar’ provas contra os denunciados e possíveis novos investigados, inclusive, nesse ponto específico, em desrespeito às regras do foro por prerrogativa de função”, ressaltou.
Para Gilmar, a atuação do MPF na delação de Diniz e a proximidade com Antônio Oliveira Santos demonstrariam indícios de “pescaria probatória e da adoção de comportamentos estratégicos de persecução penal, em conflito de interesses, por parte de agentes públicos e privados que pretendiam investigar Orlando Diniz e seus defensores”.
Por fim, Bretas teria invadido a competência do Superior Tribunal de Justiça ao determinar o cumprimento de mandados na casa de três desembargadores. Um deles com mandato no TRE de Alagoas; outro, do TRF-2, casado com uma advogada; e ainda uma terceira, do TRF-3, também casada com um advogado.
Decisão importante para a advocacia
Em seu voto, Gilmar ainda lembrou que as prerrogativas dos advogados não são “indevido privilégio profissional, mas sim garantia à própria administração da Justiça, de defesa da ordem jurídica e das liberdades fundamentais”. Afinal, segundo a Constituição, “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
O relator também lembrou que o STF já decidiu que a atividade profissional do advogado é “prática inestimável de liberdade”, e que é indispensável a imunidade profissional “para que o advogado possa exercer condigna e amplamente seu múnus público”.
“Eventuais excessos acusatórios ou a tentativa de se criminalizar, de forma ampla, a advocacia, de forma semelhante ao que se tem verificado em relação à política, possui efeitos normativos e sistêmicos extremamente perniciosos, em especial por desequilibrar a garantia da paridade de armas em detrimento dos cidadãos e de seus defensores, fazendo com que o processo se torne um instrumento de injustificável perseguição”, afirmou.
Divergência
Ficou vencido o ministo Edson Fachin. Para ele, a reclamação não seria o meio adequado para declarar a incompetência da Justiça Federal, pois “não se presta a atuar como atalho processual destinada a submeter à mais alta corte do país questões que contrariam os anseios dos reclamantes”.
Fachin também considerou que os mandados de busca e apreensão observaram, cumpriram e demonstraram os requisitos legais necessários.
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Rcl 43.479
Conjur