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DUPLA DECISÃO – Juiz, primeiro, e júri, depois, decidem a favor do New York Times em processo de difamação

Em um caso raro de decisão dupla, uma tomada na segunda-feira (14/2) por um juiz de Nova York e outra na terça-feira (15/2) pelo júri de um julgamento que o mesmo juiz presidiu, o jornal The New York Times se livrou, pelo menos em primeira instância, de um processo de difamação — mais exatamente de ofensa contra a honra por meio escrito (libel) — movido pela ex-governadora do Alasca e ex-candidata republicana à vice-presidente dos EUA, Sarah Palin.


Como o juiz decidiu trancar o processo um dia antes de terminadas as deliberações do júri, o caso poderia ser concluído com decisões contrárias, a do juiz a favor do jornal e a do júri com um veredicto favorável à autora da ação. Mas, afinal, a decisão do juiz e o veredicto do júri coincidiram — e isso irá, provavelmente, levar um tribunal de recursos a tomar a mesma decisão. E seria mais difícil se a decisão do júri fosse diferente da decisão do juiz.

Ao anunciar o veredicto do júri, o juiz federal Jed Rakoff comunicou aos jurados que já havia anunciado às partes, no dia anterior, que decidira trancar o processo. E explicou: “O trabalho de vocês era decidir sobre os fatos. O meu trabalho era decidir sobre a lei. E eu concluí que, do ponto de vista jurídico, o réu não deve ser responsabilizado.

“O juiz decidiu trancar o processo, depois de duas semanas de apresentações de provas (fora os três dias de deliberações do júri), porque a autora da ação não provou que o jornal cometeu um erro grave, em um editorial que a teria difamado, por “malícia real”. Provar que um órgão de imprensa cometeu difamação por “malícia real” — isto é, sabendo que as informações eram falsas — é o “alto padrão jurídico” exigido de autoridades para mover uma ação de difamação contra um órgão de imprensa.

Essa norma foi estabelecida pela Suprema Corte dos EUA em 1964, em uma ação que também envolveu o New York Times (New York Times vs Sullivan). A corte decidiu, então, que a liberdade de expressão, garantida pela Primeira Emenda da Constituição, restringe a capacidade de autoridades e de candidatos a cargos públicos de processar órgãos de imprensa. Além de provar as alegações de difamação, os autores de tais ações devem provar que o réu (ou ré) sabia que a informação era falsa ou não checou, irresponsavelmente, se a informação era incorreta.

Em 2017, o New York Times publicou, em editorial, uma informação falsa sobre Sarah Palin. O editorialista associou, incorretamente, um atentado em massa em 2011, que feriu a deputada Gabby Giffords, a um mapa circulado pelo comitê de campanha eleitoral de Sarah Palin. O jornal corrigiu rapidamente o erro e se desculpou. Alegou que cometeu um “erro honesto” — isto é, honestamente não sabia que a informação estava errada.

Os advogados de Sarah Palin ainda não confirmaram se irão recorrer a tribunais superiores. Os políticos republicanos esperam que o caso chegue à Suprema Corte que, hoje, tem uma sólida maioria conservadora. São seis ministros conservadores, nomeados por presidentes republicanos, e apenas três ministros liberais, nomeados por presidentes democratas.

A esperança é a de que pelo menos cinco ministros conservadores revertam o precedente de 1964, o que permitiria às autoridades processar mais facilmente os órgãos de imprensa por difamação. Pelo menos dois ministros já manifestaram interesse em revisar o precedente.

Assim como a política dos EUA e a Suprema Corte, a imprensa é costumeiramente dividida entre órgãos de imprensa conservadores e liberais. Entre os conservadores, se destacam a Fox News e o Wall Street Journal. Entre os liberais, o New York Times, o Washington Post, a CNN, a NBC e a MSNBC, a CBS, a ABC, o The Guardian (EUA), a National Public Radio (NPR) e outros.

João Ozorio de Melo – Conjur

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