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A ÉTICA PROFISSIONAL DO ADVOGADO

Toda vez que nos referimos ao termo – ÉTICA, vem-nos à mente a idéia de definição do vocábulo. Antes que isso possa ocorrer, pensemos no trinômio – Agir, Competir e Produzir. Desdobrando-se esses vocábulos em cada elemento significativo, vamos ver que: Agir significa – atuar, desenvolver esforço; enquanto que, Competir, vem-nos a idéia de lucro, de ganho pessoal. Por outro lado,Produzir, vem-nos a certeza de desenvolver uma atividade, sendo que, para isso, o homem sempre está preparado para, de qualquer maneira, superar o outro que teima em não ficar para trás. Nesse caso, verificando-se esse entrechoque de interesses, para manter-se o equilíbrio das relações entre os indivíduos de uma sociedade, veio a necessidade de estabelecer-se como regra, o conceito de ética (profissional).

                                 Ante tais cogitações, desde que o homem começou a se organizar em sociedade, já se preocupava com o ideal de lucro no que se refere às suas atividades. Portanto, para que essa interação de interesses não ocorra em meio aos competidores, veio a idéia do equilíbrio entre as atividades que iam surgindo no campo das explorações novas. Aí, então, como mediadora de tais anseios, cogitou-se do princípio que se chamou de ÉTICA, que se define como sendo: “O estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal”.

                                 Portanto, partindo-se desse princípio e, tomando-se como verdade a evolução social e política do homem, as diversas  profissões vêm tendo adesões de indivíduos ou grupos sociais em contínuas competições, o que fazem, sem a necessária observância dos exigidos princípios éticos. Com tais cuidados, para que essas competições tornem-se equilibradas, necessário seria tomar-se como meta prioritária, a observação daqueles princípios éticos, sem dúvida nenhuma, ponto de equilíbrio das diversas atividades humanas.

                                 Baseado em tais princípios, cabe-nos aqui, agora, neste esboço, abordar apenas sobre o tema escolhido – A ÉTICA PROFISSIONAL DO ADVOGADO.

                                 Falar sobre a Ética Profissional, já não é uma prática cotidiana e tão simples, ou mesmo corriqueira.

                                 Mas falar sobre a Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – é responsabilidade incomensurável,         pois ela se amplia, em vários cuidados, ponderações, sensibilidades e responsabilidades.

                                 Em sendo, pois, a ética “Ciência da Moral” e, como toda instituição tem por obrigação pugnar por essa moral, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – viu-se, na obrigação de instituir, aprovar e editar, através da Lei 8.906, de 04 de julho de 1994, e de acordo com as atribuições conferidas, nos artigos 33 e 54, V, o Código de Ética e Disciplina, as normas erigidas para nortear a conduta profissional do advogado que são:

a) A de lutar sem receio pelo primado da Justiça;

b) Pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum;

c) Ser fiel à verdade para poder servir à justiça como um dos seus elementos essenciais;

d) Proceder com lealdade e boa fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício;

e) Empenhar-se na defesa das causas confiadas ao seu patrocínio, dando ao Constituinte o amparo do Direito, proporcionando-lhe a realização prática de seus legítimos interesses;

f) Comportar-se, nesse mister, com independência e altivez, defendendo com o mesmo denodo humildes e poderosos;

g) Exercer a advocacia com o indispensável senso profissional, mas também com desprendimento, jamais permitindo que o anseio de ganho material sobreleve a finalidade social do seu trabalho;

h) Aprimorar-se no culto dos princípios éticos e no domínio da ciência jurídica, de modo, a tornar-se merecedor da confiança do cliente e da sociedade como um todo, pelos atributos intelectuais e pela probidade pessoal;

i) Agir, em suma, com a dignidade das pessoas  de  bem e a correção dos profissionais que honram e engrandecem a sua classe.

                                 Inspirados nesses postulados, através do Conselho Federal competente, e na conformidade dos dispositivos legais antes invocados, é que estão inseridas em nosso Código de Ética e Disciplina, as exigências ali estabelecidas, e por isso mesmo sentimo-nos plenificados por ter sido seu primeiro presidente (e ainda sê-lo) do Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional piauiense da OAB.

                                 Voltando-nos para o que dizem os filósofos a respeito da ética, moral e moralidade, vamos encontrar em KANT, em sua monumental Crítica da Razão Pura, onde sustenta que o senso moral é inato a todo ser humano, não derivando, portanto, da experiência. Logo, uma ação pode ser classificada boa se resulta da obediência a esse sentido interior de dever, e não em virtude de apresentar apenas bons resultados, concluindo-se, dessa afirmação que, no campo da moralidade, não tem aplicação a parêmia imediatista segundo a qual os “fins justificam os meios”, pois o que importa é seguir a lei moral, sem preocupação com lucros ou perdas materiais.

                                 As expressões moral e moralidade são usadas em diferentes contextos. Quando se fala em moralidade, logo surge a idéia, em sua concepção filosófica, da Ética, entendendo-se moral como conjunto de regras consideradas válidas, de modo absoluto, para qualquer tempo ou lugar, grupo ou pessoa determinada. Vê-se, assim, a moral como integrante do acervo espiritual do ser humano.

                                 Como expressou Anatole France, “cada época tem sua moral dominante, que não resulta nem da religião nem da filosofia, mas do hábito, única força capaz de reunir os homens num mesmo sentimento, pois tudo que é sujeito ao raciocínio os divide; e a humanidade só subsiste com a condição de não refletir sobre aquilo que é essencial para sua existência”.

                                 A Moral sempre reservou um significado oculto e deliberadamente omitido no desenvolvimento da sociedade. Não há um conceito unívoco pois, segundo aquele mesmo autor, “a moral é a ciência dos costumes, e com eles muda. Ela difere de país em país e em nenhum lugar permanece a mesma no espaço de dez anos”.

                                 A moralidade surgiria, consequencialmente, como a qualidade dessa “ciência dos costumes”. Como a moral, padece pela extrema fluidez de sua matéria essencial – a antimatéria, o costume – da ausência de qualquer uniformidade ou unanimidade não apenas conceitual, mas principalmente na aplicação ou no julgamento dos valores. A moral é uma sensação e a definiu HEMINGWAY como aquilo “que nos faz sentir-nos bem depois e imoral aquilo que nos faz sentir-nos mal depois”.

                                 Sem qualquer precisão técnica ou conceitual, vislumbramos, contudo, na representação ideal de Ética uma tentativa de uniformização dessas sensações morais, buscando senão materializá-las – o que seria impossível – ao menos dela retirar um sentido convergente de aspirações e valores sociais. A Ética representaria uma abordagem sobre as constantes morais, aquele conjunto de valores e costumes mais ou menos permanente ao tempo e uniforme no espaço.

                                 Ora, muitas determinações de moral são imposições que se encontram também no direito, não que o direito e a moral se confundam, o que há é uma distinção, não uma separação, em ambos os campos. Direito e moral são coisas distintas. BOBBIO, examinando a obra de EMMANUEL KANT, fez uma clara e nítida separação entre elas ao fixar alguns critérios de distinção. KELSEN, de forma mais vigorosa, pretendeu dissuadir por completo qualquer pretenso relacionamento que pudesse ser travado entre o conceito de norma jurídica e a norma moral onde proveio. Mas há também  correspondências cuja amplitude nunca foram  totalmente averiguadas pela doutrina.

                                 Sobre as imbricações entre Direito e Moral, HART propõe quatro questões de grande relevância para compreensão do quadro correlacional. A primeira é histórica e causal: “Teria sido o desenvolvimento do Direito influenciado pela Moral”? A resposta é afirmativa, o que não significa, de modo algum, que uma resposta também afirmativa possa ser dada à pergunta inversa: “Foi o desenvolvimento da Moral influenciado pelo Direito”.

                                 Assim, quando se fala do princípio da moralidade administrativa, p. ex., fala-se numa recíproca influência exercida pela Moral e pelo Direito, um sobre o outro, num sistema permanente de feed-back em direção a avanços cada vez mais firmemente orientados num sentido positivista da Moral e da disseminação de um sentimento ético do Direito.

                                 A segunda questão pode ser considerada analítica e conceptual. “Deve alguma referência à Moral integrar uma adequada definição do Direito ou do Sistema Legal”? Para HART, a resposta aqui também é positiva, pois “é um fato contigente que Direito e Moral freqüentemente se justapõem (como na proscrição da violência e da desonestidade) e compartilham um vocabulário comum de direitos e obrigações”. O único limite incidente que observamos – e que não foi objeto de análise por HART – prende-se às concepções morais exageradamente pessoais, objeto de juízos de valor extremamente pessoais, ainda que razoavelmente disseminados, mas desprovidos de uma concreta utilidade social. O Direito tem uma preocupação urgente com a Moral, mas não com uma moral.

                                 A terceira questão diz respeito à possibilidade e às formas da crítica moral ao Direito. “Está o Direito sujeito à crítica moral”? Ou será que “a admissão de que uma norma é uma regra legal válida e impede que esta norma possa ser condenada segundo os padrões e princípios morais”? Aqui se enfeixa a adequação do utilitarismo como uma crítica moral de instituições sociais, complementando o raciocínio anterior.

                                 A quarta questão está relacionada com a coerção legal da moralidade. “O fato de que determinada conduta seja considerada imoral, de acordo com os padrões comuns, é suficiente para justificar sua punição pela lei”? “É moralmente tolerável a imposição da moralidade, em si mesma”? “Deve a imoralidade ser tratada como uma ilicitude”? A essa questão JONH STUART MILL, em seu ensaio sobre a liberdade, deu vigorosa resposta negativa.

                                 Na exata medida em que a moral deixar de residir em superstições ou cerimoniais quando a moral perder suas ligações com os dogmas, e que “a moral é a mesma em todos os homens que usam a razão” e se extrair dela um mínimo ético, pode-se pretender fazê-la ingressar pela porta da frente do sistema legal, mormente quando decorrer do sentido de direção indicando a rota Sociedade-Estado e não a inversa. A moral é ditada pelo Estado que a reconhece (ou mais sinceramente, às vezes, não reconhece coisa alguma) e tutela. No sentido que indicamos – que é o do Direito Administrativo – a sociedade, com a sua moral, impõe padrões de conduta à Administração.

                                 Em outra linha, a partir do pensamento de KANT e KELSEN ficaram algumas distinções que marcaram fundo o evoluir desta temática. Em primeiro lugar a idéia de que a moralidade é gratuita, isto é, o comportamento moral é cumprido por mera reverência à moralidade e não por interesse. Já o Direito contenta-se com a mera conformidade da ação à lei, sem qualquer perquirição sobre os motivos ou interesses que levaram o agente a atuar.

                                 Ao fazer esta análise/reflexão sobre tão complexo assunto, esperamos ter atendido as expectativas, apesar da abordagem simples a respeito do tema por demais complexo, o que exigiria uma profundidade mais detida e acurada, rogando, por conseguinte, com o enorme furor que o caso requer, que os conceitos e opiniões aqui emitidos permaneçam nas condutas pessoais e, especialmente, profissionais de todos, quando do exercício da profissão-sacerdócio que tudo exige dentro dos padrões éticos, ou seja, com o surgimento de choques de interesses – entre os profissionais envolvidos, ou entre o profissional e seus clientes – , devem estes ser resolvidos sem que o conceito da ética seja esquecido.

 

Francisco de Sales e Silva Palha Dias é advogado militante, Presidente da APAC – Associação Piauiense de Advogados Criminalistas, filiada à ABRACRIM – Associação Brasileira de Advogados Criminalistas, ex Conselheiro da OAB-Piauí e ex Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional Piauiense da OAB.

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