Algemas da Ignorância
Esse texto se destina a todos aqueles que de alguma forma “vibraram” com a cena do ex-governador Sérgio Cabral algemado (dos pés à cabeça), mas principalmente aos “IGNORANTES”, a quem ofereço, confiante de que mudarão de opinião após a leitura.
IGNORANTE
O indivíduo ignorante vive ou atua de acordo com a ignorância, muitas vezes baseando a sua vida em preconceitos, superstições, e ideias sem fundamento. Desta forma, ele constrói um mundo falso, com noções errôneas a respeito dele mesmo e do mundo que o envolve. Esta forma de viver e de pensar do indivíduo ignorante o incapacita de ver e aceitar as verdades, e o impedem de adquirir conhecimento.
Existe uma diferença entre agir por ignorância e agir na ignorância. Quem age por ignorância age por falta de conhecimento, é forçado, tratando-se de uma ação involuntária. Quem age na ignorância age incivilizadamente de forma voluntária.¹
No caso das “Algemas do Cabral”, quem comemorou a espetacularização da proposital divulgação da cena, “são desconhecedores” do que representa aquele ato.
É preciso pensar…
Por que não vimos nenhum outro réu da Lava Jato “com os pés algemados”? Por que Sérgio Cabral mereceria tratamento tão distante da isonomia que se espera dos agentes públicos?
Alguns dirão: “é pra servir de exemplo!” ou “existia risco de fuga” (sim, eu ouvi isso hoje – como se o risco fosse maior se ele tivesse sem os pés algemados).
O exercício “do pensar” é necessário, e convido o leitor a uma brevíssima viagem histórica sobre o que chamarei de “O palanque dos bandidos e o povo como plateia”.
A instrumentalização do enforcamento e a decapitação de condenados em praça pública como forma de cumprimento da pena morte, chama atenção pelo aspecto “publicidade do ato judicial”, sim, a execução da pena em praça pública, tinha como principal objetivo dar publicidade ao ato, e lógico, para que “servisse de exemplo” aos que ousassem descumprir as leis.
Hoje, a modernidade da cadeira elétrica, o fuzilamento e a injeção letal, ainda são formas de cumprimento de execução de pena de morte, entretanto não há mais “a publicidade do ato”. Talvez a “pena de humilhação pública do réu” tenha sido revogada da legislação (se é que havia essa pena assessória).
Desnecessário se faz convidar para o ato, os filhos, amigos e parentes do réu, mas ainda há quem queira ver em vigor a obrigatoriedade de se humilhar os apenados em sua última hora…
Em verdade, o uso de algemas nos pés de Cabral, bem como, a sua publicidade, serve apenas para cumprir a parte “ilegal” do cumprimento da pena: A HUMILHAÇÃO!
O uso de algemas é regulado pela Súmula 11 do STF:
“Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”
O uso de algemas no Cabral, não se aplica a nenhuma das previsões legais, não era o caso de resistência, não havia receio de fuga e nem de perigo a integridade física dos envolvidos.
Os “aspectos legais do uso de algemas” (coisas que o ignorante não quer conhecer, à propósito deve ter abandonado a leitura quando leu: “É preciso pensar…”), tem relevância processual, mas aqui, ganha dimensões que ultrapassam os limites da lei para adentrar na esfera da dignidade do ser humano, A SIMPLES HUMILHAÇÃO DISFARÇADA DE ATO LEGAL DO ESTADO.
O ignorante não acredita em políticos, mas confia em seus comandados agentes de segurança.
Sérgio Cabral foi execrado e humilhado publicamente para satisfazer os ignorantes, que creem que o Estado “tá serto”.
Quanto as perguntas lá do início do texto: “Por que não vimos nenhum outro réu da Lava Jato “com os pés algemados”? Por que Sérgio Cabral mereceria tratamento tão distante da isonomia que se espera dos agentes públicos? – Vou deixar você pensar….
Flavio Negrone – Advogado Criminalista
1-https://www.significados.com.br/ignorante/
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