Sistema penitenciário : uma fratura exposta
A obra do Italiano Cesare Bonesana ,Marquês de Beccaria, lançada no ano de 1764 sob o título ”DEI DELITTI E DELLE PENE” ( título em Português: “Dos Delitos e das Penas”), ainda surpreende pela sua atualidade em vários aspectos. Afora as controvérsias que lhe envolvem (dúvidas sobre a “verdadeira” autoria da obra, bem como o fato do livro pertencer a um período anterior ao chamado Devido Processo Legal), de qualquer forma nada consegue subtrair o valor e importância das principais ideias contidas naquele trabalho. Os pilares do Direito Penal moderno, postuladas no texto de Beccaria, em grande parte se tornariam uma realidade.
Por outro lado tem havido, através dos tempos, certa resistência na absorção das luminares proposições do retro citado livro. Aqui no Brasil, por exemplo, ostentamos um vergonhoso quadro de desmantelamento e abandono do Sistema Carcerário. Rebeliões, domínio de facções criminosas, gestões incapazes, são alguns dos inúmeros fatores que flagelam nossa política prisional (se é que a mesma algum dia tenha existido).
Possuo 50 anos de atividade como Advogado Criminalista, já tendo até presenciado um motim no terrível Presídio Central de Porto Alegre (RS). O ano era 1987. Eu e uma colega estávamos atendendo clientes por lá, na sala reservada aos advogados para tal fim, quando somos surpreendidos com sons de tiros próximos àquele setor. Agentes Penitenciários entram no recinto e, confirmando estar havendo um motim dos prisioneiros, nos retiram daquele ambiente. Após 31 anos do ocorrido, tanto o Presídio Central quanto Instituições similares persistem em suas mazelas: Alojamentos insalubres, superlotação, violência e degradação generalizada.
É necessário que seja realizada imediata estruturação do Poder Público, à fim de que sejam aplicadas as corretas e devidas medidas ao problema carcerário brasileiro. Mesmo quando for obrigatório o uso de instrumentos repressivos, esses deverão estar em harmonia com os ditames legais e totalmente distantes da mentalidade egressa do período das “Inquisições da Idade Média” (vide o emprego abusivo de algemas nas operações policiais e o instituto da Prisão Preventiva que, na ausência de prazo determinado, por vezes torna-se uma espécie de “Prisão Pena”). Nessas horas emerge o famigerado “Clamor Popular”, quase sempre usado como “argumento” para atender pressões advindas de setores da mídia e da sociedade que, reiteradamente, clamam pelo exclusivo uso da repressão pelo Estado. O Jurista Alemão Claus Roxin, autor da teoria “Domínio do Fato”, já fez críticas ao citado “Clamor Popular” por este não corresponder ao Direito e, também disse, que o Juiz em suas decisões não pode submeter-se ao que conhecemos por “Opinião Pública”.
É imperioso que haja a merecida obediência ao que determina a Lei de Execução Penal. Não podemos permitir que o Estado Brasileiro continue desobedecendo preceitos legais e, por consequência, impedindo a efetivação do Direito Penal moderno.
ANTÔNIO BENTO MAIA DA SILVA
Advogado Criminalista
OAB/RS N° 5.091