Conscientização pela Preservação do Rio São Francisco
Jairo Sousa[1]*
Resumo: À luz das leis federais sobre a preservação dos recursos fluviais, em relação à conservação do Rio São Francisco, este artigo propõe uma análise dos temas do escoamento de esgoto in natura; da preservação das nascentes e afluentes; e do impacto da prática agropecuária, especialmente no município de Juazeiro da Bahia.
Palavras-chave: Esgoto in natura, Rio São Francisco, Preservação, Recursos fluviais.
Abstract: In the light of the federal laws on the preservation of river resources, in relation to the conservation of the São Francisco River, this article proposes an analysis of the topics of the flow of sewage in natura; preservation of springs and tributaries; and the impact of agricultural practice, especially in the municipality of Juazeiro da Bahia.
Keywords: Sewage in natura, São Francisco River, Preservation, River resources.
INTRODUÇÃO
No dia 4 de outubro de 1501 foi descoberto o Rio São Francisco, episódio que já completou meio milênio de história.
Encontrado pelos viajantes Américo Vespúcio e André Gonçalves, o São Francisco representa a força de todas as correntes étnicas do Brasil. O denominado “Rio da Unidade Nacional” aproxima o sertão do litoral e integra homens e culturas.
Sua nascente está localizada na serra da Canastra no município de Piumi, oeste de Minas Gerais, e desemboca na margem esquerda da Praia do Peba no estado de Alagoas e na margem direito da praia do Cabeço, no estado de Sergipe.
Conta com uma bacia hidrográfica cuja área soma 639 mil quilômetros quadrados e percorre 507 municípios de sete unidades da Federação totalizando 2.863 quilômetros em território brasileiro.
Apesar de sua imponente grandeza, ao longo da história o São Francisco tem recebido o impacto de vários problemas de natureza social e econômica os quais vêm afetando seu percurso natural.
O assoreamento, o desmatamento de suas várzeas, a poluição, a pesca predatória, as queimadas, o garimpo e a irrigação são os fatores que oferecem os maiores riscos.
Diante de sua extraordinária importância para o Brasil, a razão deste artigo é fomentar a reflexão trazendo à luz algumas das adversidades na busca pela preservação do Rio São Francisco.
Serão abordados os temas do escoamento de esgoto in natura; a preservação das nascentes e afluentes; e o impacto da prática agropecuária, especialmente no município de Juazeiro da Bahia.
A PRESERVAÇÃO DOS RECURSOS FLUVIAIS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Apesar de ser uma questão de bom senso, a preservação dos recursos fluviais brasileiros também encontra amparo na legislação federal.
Os artigos 20, 21 e 22 da Constituição estabelecem que são bens da União os rios, lagos e quaisquer correntes de águas situados nos seus domínios; que compete à União instituir um sistema nacional de gerenciamento dos recursos hídricos.
Vale mencionar o Código de Águas, Lei 24.643 de 10 de julho de 1934, alterado por leis posteriores, a fim de ampliar a força de seus preceitos.
O Código Florestal, Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965 apresenta normas especiais para a proteção das matas ciliares.
Outra importante regulamentação é a Lei da Natureza ou dos Crimes Ambientais, Lei 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, que trata como crime causar poluição hídrica em cursos de água de abastecimento público.
Assim, o despejo de esgoto sem tratamento nos rios é crime, sujeito às sanções previstas em âmbito administrativo, cível e criminal.
No entanto, a realidade em praticamente todas as cidades ribeirinhas ainda é contrária às disposições da lei e à preservação ambiental.
O MUNICÍPIO DE JUAZEIRO DA BAHIA
Juazeiro é uma das maiores cidades na região do Vale do São Francisco e ainda trava sérias batalhas para impedir um cenário de destruição.
Localizado ao norte do estado da Bahia, a 504 km de Salvador, na microrregião do Baixo Médio São Francisco, possui extensão territorial de 6.500,520 km² e uma população de 218.324 habitantes, segundo dados do IBGE (2015).
Historicamente serviu como antigo polo comercial do vale do Rio São Francisco, mantendo ainda a tradição da agricultura irrigada entre outras convergências como os setores universitário e turismo.
O crescimento trouxe consigo complexas implicações para a preservação de suas redes fluviais.
ESGOTO IN NATURA E A PRESERVAÇÃO DE NASCENTES E AFLUENTES
O serviço de saneamento básico, como proteção à saúde, aparece em três artigos da Constituição Federal, a saber, artigo 21, inciso XX; artigo 23, inciso IX; e artigo 200, inciso IV. Nos artigos citados consta que, em relação ao saneamento básico, a União deve instituir diretrizes nacionais, os entes federativos devem promover programas para construção e melhoria das condições habitacionais e estabelece a participação do Sistema Único de Saúde na formulação da política e da execução de ações. (CF, BRASIL, 1988).
Os indicadores de saneamento básico na bacia do São Francisco podem ser agrupados em três aspectos principais: i) os percentuais de domicílios urbanos, com canalização interna, servidos por rede de água são da ordem de 94% no Alto São Francisco, e de 80% a 94% nas demais regiões; ii) os percentuais de domicílios urbanos servidos por coleta de esgoto ultrapassam 45% no Alto, variam de 10% a 45% no Médio e Sub Médio, e são inferiores a 20% no Baixo São Francisco; iii) por fim, os percentuais tratados de volumes de esgotos urbanos que variam, na maior parte, entre 3% e 40%, refletindo a média nacional de 20,7% (CBHSF, 2011).
A falta de saneamento em grande parte da cidade de Juazeiro, faz com que as comunidades descartem o esgoto nos córregos e rede de águas pluviais que têm como destino o rio São Francisco. São efluentes domésticos e agroindustriais gerando efeitos devastadores para a sobrevivência do Rio e da vida que com ele coexiste.
Os riachos e córregos naturais que correm pela zona urbana e rural são afluentes e efluentes do São Francisco. Destaque para os riachos Macarrão, Malhada e Mulungu que cortam transversalmente a cidade.
Dentro do planejamento e loteamento de qualquer perímetro urbano se faz necessário um estudo detalhado a fim de traçar o caminho das águas. Sobretudo do leito de rios, riachos e córregos naturais.
A infraestrutura de saneamento básico de Juazeiro não acompanhou o crescimento acelerado da cidade, portanto as águas residuais seguem por meio de canais abertos e fechados que se dirigem diretamente para os riachos onde é despejado o esgoto in natura.
No contexto atual, a foz do riacho Macarrão recebe o maior volume de esgoto da cidade despejando direto no rio São Francisco.
A prevenção de uma catástrofe ambiental e socioeconômica advindas da destruição do grande Rio da Unidade Nacional depende de medidas específicas, visando a salvação das pequenas nascentes e afluentes.
O IMPACTO DA PRÁTICA AGROPECUÁRIA
As atividades agropecuárias desenvolvidas atualmente no Brasil são voltadas para atender ao mercado mundial de alimentos e combustíveis. Para tanto, têm utilizado um modelo de produção cada vez mais intensivo e tecnificado.
Essa intensificação e tecnificação têm levado os produtores rurais a utilizarem áreas naturalmente frágeis para produção agropecuária e, muitas vezes, com técnicas e práticas agrícolas que não consideram a conservação e preservação dos recursos naturais, o que pode resultar na degradação do solo, água e ar (Merten e Minella, 2002 in Broetto, 2016).
Na Serra da Canastra, a prática da pecuária extensiva, o desmatamento, os incêndios criminosos e a construção de barragens dificultam os esforços pela preservação na nascente do Velho Chico.
A degradação ambiental no Brasil decorrente da exploração da agropecuária, tem transformado consideravelmente o seu perfil, resultando em excesso de desmatamento, compactação do solo, erosão, assoreamento de rios, contaminação da água subterrânea, e perda de biodiversidade, com reflexos sobre todo o ecossistema.
Esta expansão da agropecuária tem sido feita com uso intensivo de agrotóxicos, fertilizantes e corretivos; irrigação sem controle; pisoteio excessivo de animais; monocultura e cultura em grande escala; uso inadequado de fatores de produção, emprego de alta tecnologia química e pesada mecanização.
O desmatamento leva ao acúmulo de detritos no leito do rio afetando gravemente a diversidade de espécies animais e vegetais.
OUTRAS AMEAÇAS
O Rio São Francisco possui nove hidrelétricas ao longo de seu percurso, entre elas a de Três Marias (MG) e a de Sobradinho (BA). As barragens alteram o curso do rio, impedindo a migração e reprodução de peixes e outros animais.
Algumas iniciativas governamentais estão acontecendo, tais como o Programa Bioma Caatinga que teve sua terceira etapa lançada em maio deste ano. Outro importante momento foi a visita do atual ministro do Meio Ambiente à Juazeiro. Na ocasião, Edison Duarte falou sobre os projetos para revitalização do rio São Francisco.
Segundo Coelho (2005), o programa de revitalização deveria também considerar medidas para garantir um consumo racional da água, evitando a superexploração da vazão do rio e seus afluentes, sobretudo pela irrigação e mineração.
A luta pela preservação do Rio São Francisco deve ser de todos já que o impacto ambiental atinge à toda população. Empresários, educadores, administradores públicos, profissionais, adultos e crianças devem se mobilizar em defesa do meio ambiente.
As questões de preservação do São Francisco assim como do meio ambiente, são de responsabilidade da população em conjunto com o poder público. Isto implica uma corresponsabilidade de vários tipos de agentes sociais que intervêm na transformação do espaço na cidade.
CONCLUSÃO
Os córregos e riachos da cidade de Juazeiro foram transformados em ambientes insalubres com os quais a população está obrigada a conviver. No entanto, a visão deve ser transformá-los em recursos ambientais geradores de benefícios socioambientais, econômicos e microclimáticos para a cidade.
Faz-se necessária a implantação de um efetivo sistema de esgoto separado da rede de drenagem pluvial. Desta forma seria possível a criação de espaços públicos de lazer às margens fluviais.
A riqueza das águas como fonte de vida abre um leque de possibilidades no seu uso para abastecimento humano, bem como para irrigação, geração de energia, navegação, pesca, turismo e lazer.
A existência de leis e de fiscalização não são suficientes. São necessários projetos destinados aos moradores de Juazeiro e região para conscientização sobre o trabalho de revitalização da bacia do São Francisco.
Os produtores rurais também devem receber informação adequada a fim de colaborarem na preservação das matas ciliares e nascentes que estejam dentro dos limites de suas terras.
Incontestavelmente, o assunto da preservação do Rio São Francisco é de caráter urgente. Garantir a conservação do rio significa assegurar a sobrevivência da própria população de Juazeiro da Bahia, assim como de todos os seres vivos que direta ou indiretamente dependem da existência de tão nobre caudal.
Sobreleva-se, que deixar como ai está, é compactuar com a morte majorada pelos requintes de crueldade, cada vez mais iminente desse importantíssimo Rio.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 24.643, 10 de julho de 1934. Código de Águas. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D24643.htm. Acesso em: 20 nov. 2018.
________. Lei 4.771, 15 de setembro de 1965. Código Florestal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4771.htm. Acesso em: 20 de nov. 2018.
________. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Congresso Nacional, Brasília, Distrito Federal, 1988.
________. Lei 9.605, 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9605.htm. Acesso em 20 de nov. 2018.
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________. Lei 11.445, 05 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 11 de janeiro de 2007, P.1.
BROETTO, T. Indicadores de impactos ambientais da agropecuária em bacias hidrográficas. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Agronomia. 2016.
CBHSF – COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO. Caracterização da bacia hidrográfica do rio São Francisco. Maceió: CBHSF, 2011, Disponível em: < http://cbhsaofrancisco.org.br/2017/ >. Acesso em: 20 nov. 2018.
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