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A obrigatoriedade do oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo e os mecanismos jurídicos aptos a combater a sua inobservância

A obrigatoriedade do oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo e os mecanismos jurídicos aptos a combater a sua inobservância

Thales Abrahão de Campos – advogado criminalista (OAB/SP 421.010)

O presente artigo tem como esboço central analisar a inaplicabilidade do art. 28 do CPP quando o legitimado ativo para a propositura da inicial acusatória deixar de oferecer a proposta da suspensão condicional do processo quando seus pressupostos estiverem devidamente preenchidos, bem como apresentar os mecanismos recursais aptos a combater eventuais decisões que negam o reconhecimento do direito subjetivo do réu de postular o sursis processual quando cabível.

Sabe-se que o instituo da suspensão condicional do processo encontra-se regulamentado no art. 89 da Lei 9.099/95.

Entretanto, sua aplicabilidade não se restringe apenas aos denominados crimes anões, de competência do Juizado Especial Criminal (art. 61 da Lei 9.099/95), mas, também, para todos os delitos que permitem a incidência do referido instituo, na medida em que “não existe mais nenhuma restrição aos crimes a que a Lei preveja procedimento especial”( LOPES, p. 753), ressalvada as hipóteses de competência da Justiça Militar, segundo a Lei 9.839/99.

Dessa forma, encontrando-se devidamente preenchido os pressupostos da suspensão condicional do processo, previsto no supramencionado art. 89 da Lei 9.099/95, tanto o Ministério Público como o Querelante terão o dever de oferta a proposta no momento de oferecer a inicial acusatória, tendo vista tratar-se de um direito subjetivo do réu, não admitindo, assim, qualquer juízo de oportunidade e conveniência.

A primeira questão a ser suscitada, refere-se ao fato de que se o querelante possuí legitimidade para oferecer a proposta de suspensão condicional do processo, haja vista que o art. 89 literalmente a restringiu ao órgão Ministerial.

Contudo, diante de uma interpretação sistemática não há dúvidas de que o Querelante possuí legitimidade para tanto, na medida em que o exercício de seu ius ut procedatur é pautado no princípio da oportunidade e da disponibilidade. Ademais, como bem observa Badaró (BADARÓ, p. 121):

“[…]é ilógico que a vítima possa renunciar (antes de exercer a acusação) e até perdoar (no curso do processo), mas não possa ofertar a suspensão condicional do processo. Não se justifica, à luz da estrutura em que se ergue a ação penal de iniciativa privada, que a vítima tenha apenas duas opções extremas: renúncia ( ou perdão), abrindo mão de toda e qualquer resposta penal, ou, em outro extremo, levar o processo até o final e lutar pela condenação do réu. É compreensível que a vítima queira uma resposta penal intermediária (e até consensual, ou menos litigiosa), tal como oferece a suspensão condicional do processo […]”.

Nesse mesmo contexto:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA A HONRA. LEI DE IMPRENSA. AÇÃO PENAL PRIVADA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. LEGITIMIDADE PARA O SEU OFERECIMENTO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 89, DA LEI N.º 9.099/1995. 1. O benefício processual previsto no art. 89, da Lei n.º 9.099/1995, mediante a aplicação da analogia in bonam partem, prevista no art. 3.º, do Código de Processo Penal, é cabível também nos casos de crimes de ação penal privada. Precedentes do STJ. 2. Recurso provido (Superior Tribunal de Justiça STJ – RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS: RHC 17061 RJ 2004/0178023-2).

Ultrapassada a questão quanto à legitimidade e à obrigatoriedade para o oferecimento da proposta, indaga-se: e se, preenchidos os pressupostos, o MP ou o querelante deixar de oferece-la?

No tocante ao Ministério Público, operou-se o entendimento segundo o qual deve ser aplicado, por analogia, o art. 28 do CPP, conforme se destaca da Súmula 696 do STF, in verbis:

“Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal”.

Por outro giro, nos casos em que o querelante deixar de oferecer a proposta, muitos autores entendem que nada pode ser feito, haja vista a impossibilidade de se invocar o art. 28, pois ele só tem aplicação quando a omissão é do Ministério Público.

Entretanto, não podemos corroborar com os entendimentos supratrasncritos, seja quanto a aplicação por analogia do art. 28, nos casos em que o Parquet deixar de oferecer a proposta, bem como nos casos em que a inércia for por parte do Querelante.

Este posicionamento se embasa, principalmente, por tratar-se de um direito público subjetivo do réu (postulação do reconhecimento de um direito) e, o mais grave de tudo, é o fato de atribuir a última palavra ao próprio Ministério Público – nos casos de ação penal pública -, retirando, assim, a eficácia de referido direito.

Da mesma forma, como bem observa Aury Lopes Jr. (LOPES, p. 763), estaria sendo negado, ainda, “a garantia da jurisdição, na medida em que afasta do juiz o poder de assegurar a máxima eficácia do sistema de garantias do imputado”.

Assim, em ambas as situações aqui levantadas, entendemos que caberá ao juiz fazer a proposta de suspensão condicional do processo se os pressupostos estiverem devidamente preenchidos, desempenhando, assim, seu papel constitucional de guardião dos direitos fundamentais do réu, não demonstrando qualquer incompatibilidade com o modelo constitucional-acusatório.

Nesse mesmo contexto, com propriedade esclarece-nos Pacelli (PACELLI, p. 575), aduzindo que:

“[…] o controle deve ser feito pelo juiz em momento posterior ao oferecimento da denúncia. Assim, se o Ministério Público insistir na recusa em oferecer a transação penal, quando cabível, poderá o juiz rejeitar a denúncia por falta de justa causa ou mesmo por falta de interesse de agir, sob o fundamento de que existe solução legal mais adequada ao fato e ao suposto autor”.

Por fim, caso não seja realizada a proposta e, mesmo assim, o juiz receber a denúncia ou queixa e dar prosseguimento ao feito, algumas observações merecem ser feitas.

Caso seja proferida sentença condenatória, a defesa, utilizando-se do recurso de apelação, deverá busca a nulidade da sentença no Tribunal respectivo sob o fundamento de que houve o cerceamento de defesa, fazendo com que os autos sejam devolvidos ao juízo a quo para que seja devidamente oferecido o sursis processual.

Ademais, ressalta-se que a defesa, nessa situação, não está obrigada a aceitar qualquer proposta e quaisquer condições ofertadas, na medida em que o recurso suscita a nulidade em razão da ausência de proposta, ao passo que a concordância se destina às condições a serem apresentadas. Coisas bem diferentes!

Mas, destaca-se, a defesa não deve esperar a sentença para alegar a nulidade em apelação, mas, sim, atacar pela via do Habeas Corpus – quando a nulidade se embasar no cerceamento de defesa, configurando-se uma coação ilegal -, ou mesmo do Mandado de Segurança – sob o fundamento de violação ao direito líquido e certo à concessão de um direito público subjetivo, bem como de ter o devido processo penal (LOPES, p. 773).

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Referências bibliográficas:

BADARÓ. Gustavo Henrique. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro, Elsevir, 2007.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal. – 15. Ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

PACELLI DE OLIVEIRA, Eugênio. Curso de Processo Penal. Rio de Janeiro. Lumen Juris, 2008.

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