Justiça argentina manda jornal mudar título de notícia
A Justiça Federal na Argentina determinou que o jornalClarínmodifique o título de uma notíciapublicada em abril de 2009 e que pode ser acessada pela internet. No texto intitulado “La fábrica de hijos: Concibem em serie y obtienen una mejor pensión del Estado” (Fábrica de filhos: Engravidam em série e obtêm uma melhor pensão do Estado, em tradução livre), o autor fala do aumento no número de pedidos de pensão por mulheres que têm sete ou mais filhos, benefício que já vigora há mais de 20 anos naquele país. A notícia está noLa capital.
A juíza Ana Inés Sotomayor considerou o título do texto ofensivo e com tendência a discriminação e violência psicológica, sexual e simbólica contra a mulher, além de apresentar um estereótipo que atenta contra a liberdade reprodutiva. Segundo a decisão, o jornal terá de publicar uma “correção do título” em dia de igual tiragem — no caso, domingo —, usando a mesma seção e o mesmo espaço, esclarecendo que trata-se do cumprimento de uma ordem judicial. O site doClarín, onde é possível ler o texto, também deve conter a “mesma retificação”.
De acordo com a decisão, o conteúdo do texto discrepa do título. A juíza entendeu que não houve discriminação no teor da publicação. Segundo ela, em momento algum o texto se refere às mulheres entrevistadas ou a qualquer mãe de sete ou mais filhos como uma “máquina de filhos”. Também não trata os filhos como meios de suas mães obter um benefício econômico.
Para a juíza, o título é que está “tendencioso”. A juíza supõe que o editor do jornal pretendia fazer com que o leitor tivesse uma pré-concepção em relação às mulheres retratadas. Segundo ela, é essa predisposição que provoca a discriminação e violência contra as mulheres e mães de famílias numerosas.
A juíza diz, ainda, que a sua decisão em nada afeta o direito à livre expressão. De acordo com ela, a publicação de textos errados, exagerados ou deformados que despreza a dignidade da pessoa, tratando-a com inferioridade.
O caso
O pedido foi feito em uma ação movida por duas deputadas governistas. Segundo elas, o texto demonstra “um total menosprezo pela condição feminina, o que se acentua quando se refere a mulheres que somente têm filhos com finalidades econômicas, negando que possam ter consciência de suas decisões e desejos”. Elas também alegam que a notícia só apresenta a entrevista de uma mulher que recebe o benefício, além de esta ter sido tratada de maneira pejorativa.
Já o jornal alegou que o texto, ao contrário do que afirmam as deputadas, apresentam as mulheres como pessoas que sustentam seus lares com esforço.
Na sentença, a juíza diz que as deputadas tem legitimidade para entrar com a ação, de acordo com o parágrafo 2º do artigo 43 da Constituição Nacional. Segundo o dispositivo, toda pessoa pode entrar com ação para tomar conhecimento de dados que se refiram a ela ou de sua finalidade, que constem em registros ou bancos de dados públicos ou privados destinados a prover informes. Em caso de falsidade ou discriminação, pode exigir a supressão, correção, confidencialidade ou atualização dos mesmos.
O Clarín chegou a publicar, dias depois da divulgação do texto, uma resposta na seção Opinião, equivalente ao “Cartas do leitor”, em que transcreve uma nota enviada pelas deputadas. No final, o próprio jornal acrescenta uma nota da redação que reconhece como infeliz o título do texto, mas que considera exagerado dizer que oClárinprovoca violência midiática contra as mulheres.
Fonte: WWW.CONJUR.COM.BR