Supremo enfrenta dificuldade de fazer Congresso cumprir suas decisões
O Congresso Nacional tem desafiado a autoridade do Supremo Tribunal Federal e colecionando descumprimentos de decisões da mais alta corte do país. O embate entre Judiciário e Legislativo vem se intensificando ao longo dos anos, mas desde dezembro os parlamentares vêm adotando a postura de ignorar decisões com as quais não concordam.
O caso mais recente, contou reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, foi o da liminar do ministro Luís Roberto Barroso impedindo que um projeto de reforma da Lei Geral de Telecomunicações fosse enviado à sanção presidencial. O texto prevê a transferência de R$ 89 bilhões em bens da União para as empresas. Dois dias depois da liminar, o Senado enviou o texto para a Presidência da República, acompanhado de uma nota dando ciência da decisão judicial.
Barroso viu inconstitucionalidade no fato de o projeto ter sido aprovado apenas em comissões, sem passar pelo Plenário. “Que me desculpe o ministro Barroso, mas ele não tem essa competência”, disse em seguida o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), ex-presidente da Casa e líder da bancada de seu partido. Na quinta-feira (9/2), o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), anunciou que a proposta voltou para a Casa, mas que não tomaria providências porque estava esperando a Procuradoria do Senado indicar qual o procedimento regimental mais adequado para resolver o impasse.
O Estadão também lembra da liminar em que o ministro Luiz Fux determinou que um projeto do Ministério Público Federal para reforma do processo penal voltasse à Câmara. Segundo Fux, como o projeto é de iniciativa popular, os deputados não poderiam ter feito alterações nele. A decisão é de dezembro, e o projeto continua no Senado.
Situação parecida acontece com a liminar do ministro Marco Aurélio que mandou a Câmara instalar uma comissão especial para analisar um pedido de impeachment do presidente Michel Temer. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alega que as lideranças não indicaram membros para compor a comissão.
Os casos lembrados pelo Estadão são de janeiro deste ano. Em dezembro de 2016, o Senado ignorou liminar que afastava o então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), do cargo. O ministro Marco Aurélio decidiu que Renan deveria deixar a cadeira porque havia se tornado réu por peculato e réus não poderiam estar na linha sucessória da Presidência da República. No dia seguinte, a Mesa do Senado decidiu ignorar a decisão até que o Plenário do STF deliberasse sobre o tema. E Marco Aurélio ficou vencido.
Depois do imbróglio, Renan Calheiros disse, numa sessão do Senado, que “decisão ilegal não é para ser cumprida”. Para ele, trata-se de um “dever de cidadania”.
Em novembro, Rodrigo Maia (DEM-RJ) decidiu se colocar contra uma decisão da 1ª Turma do Supremo. O colegiado havia entendido que interrupção de gravidez até o terceiro mês não pode ser enquadrada no crime de aborto do Código Penal. No mesmo dia, Maia anunciou a criação de uma comissão para analisar se a competência do Congresso não fora invadida.
Maia deixou claro que a comissão foi uma resposta à decisão do STF, que, segundo ele, legislou sobre o tema. “Tenho discutido com muitos líderes que, às vezes, o Supremo legisla. Entendemos que isso aconteceu e minha posição, discutindo com líderes, é que toda vez que entendemos que isso acontece nossa obrigação é responder, por que há uma interferência do Poder Legislativo”, disse, no dia seguinte.
Dias depois, o Supremo decidiu se adiantar à postura do Congresso e determinou que, caso o Legislativo não regulamente uma decisão em um ano, o Tribunal de Contas da União assumirá o papel. Isso aconteceu no julgamento que definiu a omissão inconstitucional do Congresso em não dizer quanto a União deve repassar aos estados pela imunidade de ICMS a produtos destinados a exportação.
O relator do processo foi o ministro Gilmar Mendes, que anda preocupado com o destino que as decisões do Supremo têm encontrado. Para ele, se o tribunal não encontrar formas de fazer executar seus acórdãos, os julgados da corte tendem a se transformar em “em meros discursos lítero-poéticos”.
Fonte: www.conjur.com.br