Delegado perde cargo por registrar ocorrência de forma contrária à lógica
Agentes públicos também respondem por improbidade administrativa quando praticam atos baseados em opinião que transborda o lógico e as teses já pacíficas na jurisprudência e nas práticas da carreira. Assim entendeu o juiz Bruno Machado Miano, da Vara da Fazenda Pública de Mogi das Cruzes (SP), ao condenar um delegado pela forma como registrou o caso de uma mulher flagrada com 40 gramas de maconha ao visitar um preso no Centro de Detenção Provisória da cidade.
Miano concluiu que ele deve perder o cargo porque, em vez de ter lavrado o auto de prisão em flagrante como tráfico de drogas (com base no artigo 33, caput, da Lei 11.346/2006), afirmou que a mulher apenas tentou oferecer a droga ao namorado, para os dois consumirem juntos e sem objetivo de lucro (parágrafo 3º do mesmo dispositivo).
O Ministério Público denunciou o delegado na esfera criminal, sob acusação de prevaricação, e na esfera cível, por improbidade. O réu foi absolvido no primeiro caso, em primeiro e segundo graus, e no outro processo negou dolo ou má-fé. Ele também defendeu sua independência funcional, afirmando que não poderia ser punido por interpretação diferente do promotor de Justiça ou do juiz.
A sentença, no entanto, afirma que a liberdade de convicção do delegado de polícia não o torna “autoridade irresponsável pelos atos que pratica”, pois “também responde o agente administrativo se sua opinião (…) transborda o lógico, o razoável, aquilo que já está assentado na jurisprudência, nas práticas de sua carreira, por exemplo”.
Segundo o juiz, um profissional “experiente, prestes a se aposentar, sabe bem” que 40 gramas de maconha não poderiam ser consumidos num só dia de visita. “Seria impossível fumar a quantidade de cigarros que essa porção permite confeccionar, sem chamar a atenção da autoridade penitenciária. Ademais, ouvidos os agentes de segurança penitenciária, todos disseram que a capitulação jurídica empregada pelo réu foi dissonante do que reiteradamente ocorre”, afirmou.
Miano viu clara ofensa à lei na indevida conduta de deixar de praticar ato de ofício, com violações aos deveres de honestidade e de lealdade institucional. Ele considerou necessária a perda do cargo “para resguardo da comunidade, que não poderia ficar à mercê de novas práticas tais como a aqui exposta (inclusive sob o pretexto de que se trata, realmente, de entendimento jurídico — e não de ato isolado)”.
O delegado também fica proibido de contratar com o poder público e de receber incentivos fiscais por três anos. Como o réu não exerce nenhum cargo eletivo, a sentença deixou de suspender seus direitos políticos. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-SP.
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1008253-56.2014.8.26.0361
Fonte: www.conjur.com.br