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A ambigüidade da redação da Súmula 385 do STJ e sua aplicação equivocada.

As Súmulas editadas pelos Tribunais Superiores dão um norte a todos os operadores do direito para invocá-las à aplicação em casos concretos, mas, por outro lado, sobretudo os advogados, devem apontar suas distorções colimando impedir que sejam utilizadas como instrumentos automáticos para julgamentos em massa, cuja pressa se desdobra em decisões equivocadas, injustas e contrárias às leis vigentes, in casu, a norma cogente do art. 43, § 2º, da Lei 8.708/90, prejudicando, pois, toda a sociedade de consumo.
A Súmula 385 do STJ prescreve:
“Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito do cancelamento”.
A sociedade brasileira, há tempos, encontra-se à mercê de um poder opressor/paralelo, que são os cadastros de inadimplentes (SERASA, SPC, CDL, etc.). Basta que o nome de um consumidor esteja inserido em qualquer cadastro restritivo que, automaticamente, estará alijado de participar do mercado de consumo através da concessão/obtenção de crédito.
Por essa razão, a festejada norma cogente, Código de Proteção e Defesa do Consumidor, foi dotada de dispositivo expresso (art. 43, § 2º) acerca da necessidade de prévia notificação, para dar legalidade à anotação em qualquer cadastro de maus pagadores, com o fito de oferecer ao consumidor o direito ao contraditório, o possibilitando esclarecer que a dívida, entre outras razões, inexiste, ou que já foi paga, ou dá-lo a oportunidade de adimplir com seu débito.
Reza o § 2º do art. 43 do CDC:
“A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele”.
Havia em curso, no ano de 2008, milhares de ações com o mesmo objeto, qual seja, todas em face dos bancos de dados de restrição ao crédito (SERASA, SPC, CDL, etc.) que, a parte autora, embora reconhecendo a existência/legitimidade da dívida/inscrição, buscava-se a reparação cível com o pedido de danos morais por ausência de notificação prévia, na forma do art. 43, § 2º do CDC, bem como o cancelamento da anotação, o que motivou o incidente de recurso repetitivo, Recurso Especial nº 1.062.336 – RS.
Abrolhou, então, o debate acerca da notificação ao consumidor, se seria necessária a comunicação pessoal, ou se seria válido o mero envio de carta ao endereço cadastral dos bancos de dados restritivos, o que ecoou no Superior Tribunal de Justiça as decisões conflitantes em todos os Tribunais do país e, por conta do julgamento do Recurso Especial nº 1.062.336 – RS, na forma do art. 543-C do antigo CPC, a relatora Ministra Nancy Andrighi foi zelosa ao ressaltar sobre a delimitação de julgamento, sobretudo na orientação aos futuros julgamentos dos processos com idêntica questão de direito, e afirmou:
“…Na decisão que instaurou o Incidente de Recurso Repetitivo, determinei fossem suspensos os processos dos recursos especiais “que versem sobre indenização por danos morais decorrente de inscrição do nome do devedor nos cadastros de restrição ao crédito com ausência de comunicação prévia, em especial nos casos onde o devedor já possua outras inscrições nos cadastros de devedores”. (fls. 258/259).
Nos termos do art. 543-C, § 7º, do antigo CPC, a orientação do Acórdão acima indicado, é que “a ausência de prévia comunicação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastros de proteção ao crédito, prevista no art. 43 , 2º do CDC, enseja o direito à compensação por danos morais, salvo quando preexista inscrição desabonadora regularmente realizada.
Entretanto, é evidente que a Súmula 385 do STJ está sendo aplicada de forma equivocada face à ambigüidade do texto, posto que os aplicadores do direito não a interpretam segundo a orientação delineada no julgado, Recurso Especial nº 1.062.336 – RS, já que as ações objeto do recurso repetitivo versão sobre ausência de notificação prévia e, todas elas, foram ajuizadas em face dos órgãos restritivos de crédito:
“REsp 1046881, pelo Recorrente, Clenio Pereira Nunes; pelo Recorrido, CÂMARA DE DIRETORES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE CDL; REsp 1057337, pelo Recorrente, Paula Cristiane de Oliveira Teixeira, Pelo Recorrido, SERASA S/A; REsp 1081404, pelo Recorrente, Eli Machado, pelo Recorrido, CÂMARA DE DIRETORES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE CDL; REsp 1081845, Recorrente, Soroti de Lourdes Dorneles Machado, Recorrido, CÂMARA DE DIRETORES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE CDL; REsp 992168, Recorrente, Gilberto Martins, Recorrido SERASA S/A; REsp 1002985, Recorrente, Nina Rosa Silveira de Andrades, Recorrido, CÂMARA DE DIRETORES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE CDL; REsp 1008446, Recorrente Cinthia Shena Menine, Recorrido, SERASA S/A”.
O dano moral, é induvidoso, deve ser concedido aos consumidores nas ações de reparação civil por negativação indevida, ainda que haja outras anotações nos cadastros restritivos de crédito em nome do demandante/consumidor, porquanto a Súmula 385 do STJ somente deve ser aplicada nas ações cujo objeto é a indenização por danos morais pela mera ausência de notificação prévia do consumidor, e que figuram no pólo passivo empresa que explora atividade de banco de dados de restrição ao crédito, e que na inicial o autor/consumidor reconheça a dívida como existente/legítima.
Conclui-se, portanto, que nas ações de reparação civil em face de empresas que não exploram atividade de banco de dados de restrição ao crédito, com motivação diversa daquela que deu causa à Súmula 385 do STJ (mera ausência de notificação prévia do consumidor, na forma do art. 43, § 2º do CDC), ainda que haja outras anotações, não se sabendo se são ou não legítimas, não há que se falar em adotar interpretação para o não arbitramento de danos morais, sob pena de não ser realizada a reparação civil do consumidor, bem como de não coibir que o poder opressor/paralelo dos órgãos de maus pagadores continuem cada vez mais a excluir pessoas do mercado de consumo.
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Anderson da Costa Gadelha, OAB/RJ 140.556
Advogado Criminalista
Membro da ABRACRIM

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