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A (i)maturidade dos profissionais do direito – Por Jader Marques

Por Jader Marques – 01/11/2016
As pessoas que atuam no processo penal brasileiro possuem maturidade suficiente? Seria possível evitar a ocorrência de nulidades processuais, caso houvesse mais maturidade? Haveria diminuição na quantidade de incidentes entre as partes se houvesse mais maturidade? A vaidade, a birra, a teimosia, a insegurança, a grosseria, seriam características de comportamentos imaturos?
Inicio essa coluna pedindo desculpas a todas as pessoas com as quais trabalhei no tempo em que eu era inseguro, agressivo, deselegante, intempestivo, enfim, imaturo. Meu pedido sincero de desculpas aos advogados, juízes, promotores, delegados, serventuários, por qualquer excesso ou deslize que eu tenha cometido.
Prometi aos acadêmicos de uma faculdade de direito da cidade do Rio Grande (RS), que faria um texto sobre a (i)maturidade dos jogadores no processo penal brasileiro.
Nietszche diria que o poder imbeciliza as pessoas e quem sou eu para discordar dele. Da minha parte, penso que o poder apenas dá asas ao imbecil (ele já era um imbecil antes de ter poder) e vejo essa pessoa como alguém que não ingressou, por algum motivo a ser investigado na terapia, na fase adulta. Antes de ter poder, ninguém notava o quanto ele já era um imbecil, ou seja, era um imbecil que estava quieto, adormecido, intimidado.
Pois bem, penso que a falta de maturidade pode ser uma boa explicação para boa parte dos “incidentes” que acontecem entre os profissionais que atuam no processo penal, infelizmente, produzindo terríveis consequências para os acusados.
Ainda que correndo o risco de ser maniqueísta ou caricato, faço um paralelo entre o comportamento de profissionais imaturos, infantis e outros que já ingressaram na fase adulta, sendo, portanto, mais capazes de lidarem com a “vontade de poder”.
Há um jeito certo de fazer as coisas.
Pessoas maduras fazem as coisas que devem ser feitas e do jeito certo, ainda que contrariadas as suas expectativas ou a sua vontade.
Já as pessoas imaturas insistem em fazer todo o possível para que as coisas aconteçam conforme o seu desejo. Profissionais do direito infantilizados, geralmente, são pessoas irritadiças, mal-humoradas, destemperadas, autoritárias. Toda a vez que as coisas não acontecem de acordo com a sua expectativa, seu desejo ou que seu poder é confrontado, o jurista imaturo descarrega sua ira sobre todos aqueles que representam uma ameaça. O inquérito é do meu jeito, a audiência é do meu jeito, a acusação é do meu jeito, a defesa é do meu jeito. Qualquer coisa diferente do “meu jeito” é algo feito “contra mim”. Alguns até choram.
As discussões devem ser levadas no plano das ideias.
A maturidade profissional mostra que não é possível levar as divergências para o plano pessoal. Um adulto faz o seu trabalho. Simples assim. Defender uma tese, uma interpretação, uma versão dos fatos, não pode ser uma atitude do bandido contra o xerife, do vilão contra o super-herói, do bem contra o mal ou do bom contra o mau, porque isso é coisa de criança.
Os imaturos perdem a linha e deslocam a discussão para o plano pessoal. Acusadores, muitas vezes, sentem-se tomados por um forte sentimento de raiva, especialmente quando a defesa, por alguma prova ou argumento, diminui as chances de condenação de algum acusado, chegando ao absurdo de fazerem ofensas pessoais, ameaças e até ofensas à integridade. Juízes, na falta do promotor, muitas vezes tomam o lugar daquele na audiência e fazem toda a prova necessária para a satisfação do seu desejo infantil: condenar o bandido malvado.
Quando confrontados no seu desejo infantil de “ganharem o jogo”, ofendem diretamente o oponente vitorioso, que agora é bobo, feio, chato. Quando não ganham, muitas vezes choram.
Na vida, nem tudo acontece como planejamos ou queremos.
O profissional do direito que atingiu a fase adulta sabe que nem tudo acontecerá do jeito que ele idealiza, que nem tudo dará prazer, que nem tudo será motivo de alegria e que o respeito à regra do jogo é mais importante do que a satisfação de uma vontade, porque o direito é uma proteção contra o julgamento moral feito pelo “homem de bem”. Os maduros, quando estão com medo do fracasso, enfrentam a situação de cabeça erguida, fazendo jus à responsabilidade da posição que ocupam, ou seja, quando estão com medo, agem com medo mesmo, mas com a intenção do acerto.
A insegurança e o medo do fracasso são as características mais marcantes de um profissional do direito imaturo e a prepotência nas atitudes revela, de forma muito clara, essa insegurança.
A fantasia de que tudo pode dar errado e de que a máscara pode cair são grandes fatos geradores de conflito entre as partes e, por consequência, de nulidades processuais graves. As pessoas adultas sabem que algo pode dar errado, que podem ocorrer falhas, que eles podem fracassar ou perder. Já as imaturas reagem de forma impulsiva, quando estão pressionadas ou submetidas a algum tipo de avaliação.
Os maduros pensam, ponderam e apenas agem quando são capazes de dar a melhor solução para o impasse, cientes de que o mundo não vai acabar se as coisas não saírem como planejado ou como foi desejado. Sabem que reações impulsivas podem levar a consequências terríveis. Os imaturos, pressionados, muitas vezes choram ou agridem.
Comunicar-se com clareza é uma condição fundamental para ser respeitado.
Autoridades maduras conseguem questionar suas próprias atitudes e, consequentemente, são pessoas que se comunicam de forma educada, inclusive, diante de pessoas com dificuldade, nervosas, ignorantes, deselegantes. O tratamento adequado e horizontal é dispensado pelo profissional adulto a todas as pessoas, indistintamente.
Profissionais imaturos não sabem comunicar a sua intenção, a sua interpretação ou a sua ordem com clareza para as demais pessoas envolvidas no processo. Uma autoridade imatura e que se não comunica adequadamente, geralmente exige que todos façam as coisas conforme a sua vontade, mesmo que esta não tenha sido revelada, o que propicia toda sorte de inconvenientes, constrangimentos e conflitos.
E se cada um desempenhasse adequadamente o seu papel?
Um profissional adulto procura saber o que está fazendo, para onde está indo e procura orientar as suas ações para a obtenção dos fins específicos esperados para aquele papel desempenhado, ou seja, encaram o trabalho com responsabilidade, com respeito ao outro e atendendo ao dever de zelo e dedicação, porque não há razão para ser diferente. Algo deve ser feito e será feito da melhor forma possível, sem criar problemas para as outras pessoas.
Profissionais imaturos, por outro lado, não são confiáveis, falam uma coisa e fazem outra, atrasam-se para os atos processuais ou faltam ao compromisso, perdem prazos, confundem e criam desordem, porque acreditam que tudo dará certo no final. Muitas vezes, possuem o objetivo obsessivo de impressionar as pessoas pelas suas (nem tão evidentes) qualidades. Agem como se fossem crianças competitivas, que necessitam vencer sempre, chegar em primeiro lugar, furar a fila e ter vantagem. Para isso, manipulam, constrangem, chantageiam, usam métodos errados, mas sempre voltados para o próprio umbigo, para a satisfação das suas vontades, atuando de forma egocêntrica, pois acreditam que o melhor desfecho para tudo é a realização da sua expectativa. Quando não conseguem, geralmente, choram ou agridem.
Insisto no que tenho afirmado: não necessitamos de leis melhores; necessitamos é de pessoas melhores. No caso do processo penal, pessoas adultas já estaria de bom tamanho.
Para finalizar com Nietszche: “A maturidade do homem consiste em haver reencontrado a seriedade que tinha no jogo quando era criança”. Ou como dizia a minha avó: cresça e apareça!
Mais não digo!
Jader Marques é Advogado desde 1996. Especialista e Mestre em Ciências Criminais pela PUC/RS e Doutor em Direito pela UNISINOS/RS. Integra a Associação dos Escritórios de Advocacia Empresarial – REDEJUR, o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados – CESA e o Instituto Transdisciplinar de Estudos Criminais – ITEC. Presidente da ABRACRIM-RS.

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