ADVOGADO, PRERROGATIVAS E CRIMINALIZAÇÃO
Por Marcus Valério Saavedra Guimarães de Souza*
Históricas afrontas patrocinadas por autoridades policiais, do Ministério Público e mesmo judiciárias, contra advogados no exercício da profissão, violando-lhes as prerrogativas asseguradas por Lei, parecem ter inspirado a Seccional da OAB/SP, à apresentação do projeto de Lei, para a criação de tutela penal mínima indispensável, almejando inibir condutas incompatíveis com os direitos do advogado, e, por extensão, extremamente lesivas ao causídico, seu cliente e à democracia.
De fato, a Constituição Federal assegura um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, o exercício da cidadania, quando atribui ao advogado, função indispensável à administração da justiça, (CF, art. 133). Assim, antes de censurar a proposta legal, é preciso enxergar que a Lei, a rigor, nunca tutela interesse privado propriamente dito.
Não é possível democracia sem a correspondente garantia do exercício pleno da cidadania, a qual somente pode ocorrer se resguardada a administração da justiça, em sede de mais absoluta prioridade do Estado.
Nem é coerente à razoabilidade, se permitir que direitos sejam indiscriminadamente exercidos, ou que poderes institucionalizados, se mostrem infensos a limites, incapazes de assegurar que, aos excessos e arbitrariedades, se sobreponha a responsabilização e o controle social.
O Projeto de Lei nº. 4.915/2005, ora em tramitação no Congresso Nacional, define como crime a violação de direitos e prerrogativas do advogado, notadamente o disposto no artigo 7º e seus incisos da Lei 8.906/1994, o EOAB.
Referido projeto legislativo prevê prisão de seis meses, a dois anos, pela prática de atos que impeçam ou limitem a atuação profissional dos advogados, causando prejuízo à defesa dos clientes. Se a conduta definida como infração penal resultar prejudicial ao interesse do advogado, a sanção pode ser aumentada, de um sexto até metade, prevendo ainda a proposta que a OAB pode pedir que advogados atuem como assistentes do Ministério Público, em ações penais instauradas, em face da aplicação da Lei.
Significa isso que, se aprovada o novo Estatuto Legal, a OAB assume nova e importante função institucional, coadjuvando o Ministério Público, agora como partícipe na fiscalização da Lei, pretensão que ganha mais consistência, a partir da norma constitucional, que inclui o advogado como agente indispensável à Administração da Justiça, restando certo que esta administração somente é possível com a correta aplicação das Leis.
Se assim aprovada, a Lei cria situação sui generis em que, no processo penal, a OAB atuará, tanto no pólo ativo, como custos legis, quanto no passivo, como defesa.
No Estado Democrático de Direito, enquanto a cidadania não estiver imune ao jugo do arbítrio e da prepotência, não há Justiça, o que justifica o tratamento penalista que o Projeto propõe, por transformar a conduta infracional perpetrada contra advogado, em crime de ação penal pública incondicionada, característica que a Lei de Abuso de Autoridade, além de outras providências previstas na proposta da Lei Especial, não prevê, eis que, por aquele Estatuto Legal, a ação penal depende de representação.
Mesmo no campo do direito privado, a Lei busca a paz, que é apanágio do interesse social, no sentido de que toda Lei contém interesse público.
*Marcus Valério Saavedra Guimarães de Souza – Presidente ABRACRIM PA.
Fonte: http://valeriosaavedra.jusbrasil.com.br/