ATUAÇÃO DIRIGIDA – Lewandowski suspende ação contra Lula por compra de caças para a Aeronáutica
Integrantes do Ministério Público têm o dever de agir com imparcialidade e lealdade. Por enxergar indícios de suspeição e incompetência dos procuradores da República Frederico de Carvalho Paiva e Herbert Reis Mesquita, o ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski suspendeu, nesta quarta-feira (2/3), a ação penal contra o ex-presidente Lula que investiga irregularidades na compra de caças suecos para a Aeronáutica. O processo corre na 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal.
Os procuradores acusam Lula de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa por ter participado de supostas negociações irregulares para aquisição de caças em processo que começou no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e foi finalizado na gestão de Dilma Rousseff. A decisão coube à Aeronáutica. Segundo a denúncia, os crimes teriam ocorrido entre 2013 e 2015, durante o primeiro e o segundo mandato de Dilma.
A defesa de Lula, comandada pelos advogados Cristiano Zanin, Valeska Teixeira Zanin Martins e Larissa Teixeira Quattini, pediu que a 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal declarasse a suspeição dos procuradores Frederico de Carvalho Paiva e Herbert Reis Mesquita para atuar no caso.
Os advogados do petista afirmam que as mensagens entre procuradores que atuavam na “lava jato” obtidas por hackers revelam que a denúncia dos caças foi idealizada pelos integrantes da operação de Curitiba, dentro de um “plano” que buscava liquidar Lula por meio de “acusações frívolas, apresentadas em número elevado e repetidas”.
Em sua decisão, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que não é possível abandonar a presunção de que a compra dos caças ocorreu dentro da legalidade, até porque, passados sete anos da assinatura do contrato, ele não foi contestado por parte dos órgãos de fiscalização, a exemplo da Controladoria-Geral da União, do Ministério Público Federal ou do Tribunal de Contas da União.
O magistrado destacou que não há suporte idôneo para deflagrar a ação criminal contra Lula. Isso porque, nas conversas obtidas por hackers, Frederico de Carvalho Paiva e Herbert Reis Mesquita “jamais deixaram de reconhecer a fragilidade das imputações que pretendiam assacar contra o reclamante [Lula]”. Como exemplo, o ministro citou um trecho em que Mesquita admite que não havia “nada de anormal na escolha [dos caças suecos]”.Em grupo no aplicativo Telegram denominado “Chat Caças Zelotes – LJ”, integrado por diversos membros da “lava jato” curitibana e por Mesquita e Paiva, este revelou seu ceticismo quanto às imputações, ao assentar que, “[e]m suma, não vejo correlação com os caças”, referindo-se à Medida Provisória 627, que os investigadores curitibanos procuravam relacionar à compra dos caças suecos, com o intuito de emprestarem maior consistência à acusação, mencionou Lewandowski.
Nessa mesma linha, Mesquita manifestou a sua opinião quanto à inconsistência da imputação a ser formulada contra Lula, aduzindo que via “uma fragilidade da denúncia mais pela discussão jurídica do que fática (provas)”.Em outro momento, Paiva, embora concordasse em dar continuidade à confecção do enredo acusatório, chegou a afirmar o seguinte: “É praticamente impossível achar o agente público neste caso”. “Em outras palavras, reconhecia ser impraticável a configuração do crime de corrupção, que, de acordo com a legislação pátria, deve, necessariamente, envolver a atuação de um servidor estatal”, declarou Lewandowski.
Ele lembrou que os procuradores de Curitiba não tinham competência para investigar Lula, como já declarado pelo Supremo. Ainda assim, trabalharam no caso com os colegas do Distrito Federal — Paiva e Mesquita.”Não bastasse isso, é possível verificar, ainda, neste exame preliminar dos autos, que os integrantes da ‘lava jato’ de Curitiba não apenas idealizaram, desde os seus primórdios, a acusação contra o reclamante objeto da presente contestação — possivelmente movidos pelos mesmos interesses heterodoxos apurados em outras ações que tramitaram no Supremo Tribunal Federal — como também, pasme-se, revisaram a minuta da denúncia elaborada pelos procuradores do Distrito Federal.”
De acordo com o ministro, os membros do MPF também agiram com parcialidade contra Lula. “Nesse diapasão, anoto que constitui obrigação do parquet – mesmo nos casos em que atue como parte no processo – postular medidas que possam proteger os direitos fundamentais dos réus e condenados em geral, ainda que seus membros possam ocupar posições processuais distintas, pois incumbe-lhes o dever de agir com a máxima lealdade (fairness) em sua atuação institucional.
“Dessa maneira, Lewandowski entendeu que há indícios de suspeição e incompetência na atuação de Paiva e Mesquita. E isso sugere, no mínimo, desrespeito ao dever de integrantes do MP de zelar pela dignidade das respectivas funções e da própria Justiça, “eis que evidenciam, quando menos, franca antipatia e, em consequência, manifesta parcialidade em relação à pessoa do reclamante [Lula]”, analisou o magistrado.
Em nota, a defesa de Lula afirmou que “a robusta decisão do ministro Ricardo Lewandowski acolheu os elementos que apresentamos e reconhece que a ação penal referente ao ‘Caso Caças Gripen’ fazia parte do “Plano Lula”, que foi engendrado por integrantes da extinta ‘lava jato’ para cassar arbitrariamente os direitos políticos do ex-presidente e para sobrecarregar — e tentar inviabilizar — o trabalho de sua defesa, atuando inclusive em cumplicidade com membros do Ministério Público de outras jurisdições”.
“Além de aplicar o melhor Direito ao caso concreto”, continua a nota, assinada por Cristiano Zanin Martins e Valeska T. Zanin Martins, “a decisão é um importante registro histórico sobre o uso estratégico do direito para fins ilegítimos (lawfare), que foi praticado pela ‘operação lava jato’, que atacou o próprio Estado de Direito e feriu a Democracia no país”.
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Rcl 43.007
Sérgio Rodas – Conjur