DE VOLTA AO TRABALHO – STF retoma discussão sobre letalidade das operações policiais no Rio
O Supremo Tribunal Federal abrirá os trabalhos deliberativos de 2022 nesta quarta-feira (2/2) com uma pauta carregada de temas importantes. O destaque é a continuação do julgamento de um recurso sobre as operações policiais no Rio de Janeiro durante a crise sanitária de Covid-19.
Da última vez em que o tema foi discutido, na sessão de 15 de dezembro do ano passado, apenas o ministro Luiz Edson Fachin reafirmou seu voto a favor de diminuir a letalidade das operações policiais nas comunidades fluminenses, principalmente depois da incursão policial na favela do Jacarezinho, que, em maio do ano passado, deixou 28 mortos.
Na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator sobre a necessidade de adotar medidas claras para diminuir a violência policial, mas divergiu sobre o alcance de algumas das providências a ser adotadas.
“Quem acha que tem poder para tirar uma vida imagina que também tem para não a tirar e, com isso, passa a negociar a vida. Quem faz operação autonomizada não é policial, é miliciano. E miliciano não pode ter lugar no Estado de Direito e muito menos na polícia”, disse o ministro Fachin em um complemento de seu voto.
“A crise da segurança pública, sobretudo no estado do Rio de Janeiro, é um verdadeiro estado de coisas inconstitucional. Nada evidencia mais esse estado de coisas do que as recentes notícias de ações policiais que descumprem a determinação do Plenário do Supremo Tribunal Federal no sentido de que apenas em casos excepcionais as operações poderiam ser realizadas”, acrescentou.
Pelo tom do voto do ministro Fachin, já se imagina que o tema é sensível, principalmente por abordar pauta que interessa ao governo, a questão da segurança pública e das operações policiais nas comunidades do Rio.
O relator havia deferido um pedido de medida cautelar em petição apresentada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) a fim de determinar ao estado do Rio de Janeiro que elabore e encaminhe ao STF, no prazo máximo de 90 dias, um plano visando à redução da letalidade policial e ao controle de violações de direitos humanos pelas forças de segurança fluminenses, que contenha medidas objetivas, cronogramas específicos e a previsão dos recursos necessários para a sua implementação.
Em seu voto, o ministro determina que, até que um plano mais abrangente seja elaborado, o emprego e a fiscalização da legalidade do uso da força sejam feitos à luz dos Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, “com todos os desdobramentos daí derivados, em especial, em relação à excepcionalidade da realização de operações policiais”.
Além disso, propõe a criação de um observatório judicial sobre polícia cidadã, formado por representantes do STF, pesquisadores e pesquisadoras, representantes das polícias e de entidades da sociedade civil, a serem designados pelo presidente do Tribunal, após aprovação de seus integrantes pelo Plenário da Corte.
“Só se justifica o uso da força letal por agentes de Estado em casos extremos quando, (i) exauridos todos os demais meios, inclusive os de armas não-letais; (ii) ele [uso da força] for necessário para proteger a vida ou prevenir um dano sério; (iii) decorrente de uma ameaça concreta e iminente. Em qualquer hipótese, colocar em risco ou mesmo atingir a vida de alguém somente será admissível se, após minudente investigação imparcial, feita pelo Ministério Público, concluir-se ter sido a ação necessária para proteger exclusivamente a vida e nenhum outro bem de uma ameaça iminente e concreta”, sustenta o ministro Fachin.
No seu entender, existe “imperiosa necessidade” de, nos termos do artigo 227 da Constituição Federal, haver prioridade absoluta nas investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças e adolescentes. E também pede a suspensão do sigilo de todos os protocolos de atuação policiais no Estado do Rio.
Além disso, Fachin sugere que as viaturas policiais passem a ter GPS para que os movimentos dos encarregados das operações sejam monitorados. E também quer que os militares carreguem, nas fardas, câmeras que possam gravar em áudio e vídeo a totalidade das ações.
Outros assuntos
Também estão na pauta da sessão o recurso com repercussão geral sobre a necessidade de negociação coletiva antes de demissões em massa (RE 999.435) e o referendo da liminar que determinou que as federações partidárias obtenham registro de estatuto até seis meses antes das eleições (ADI 7.021).
Pode ser discutida ainda a ação apresentada pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ) contra as restrições impostas pela Lei das Eleições (Lei 9.504/1997) à veiculação de propaganda eleitoral paga em jornais impressos. A ação, com pedido de medida cautelar, foi distribuída ao ministro Luiz Fux.
A norma contestada restringe a propaganda paga em veículos de comunicação impressa na antevéspera das eleições e a limita a até 10 anúncios por veículo, em datas diversas, para cada candidato. Estipula ainda espaço máximo em páginas de jornais, revistas ou tabloides. Outro dispositivo contestado estende a vedação aos sites dos veículos na internet, admitindo somente o impulsionamento de conteúdo devidamente identificado.
ADPF 635
Severino Góes – Conjur