Delação póstuma é sentença de delator! Nulidade.
(Por: Elias Mattar Assad)
Sentença vem de “sentir”. Só a paranoia se alimenta de si própria…
Delações, órfãs de outras fontes probatórias seguras e baseadas apenas nas versões cerebrinas de delatores e acusadores, padecem de invalidade por “nebulosa circunavegação subjetiva”. Sabe-se lá o que se vai no insondável de pessoas ou grupos e a Justiça não pode se embrenhar no campo das falazes ilusões.
Se um acusado, como se verá, assiste a todos os atos do processo criminal silenciando em seu interrogatório e, depois, de posse de todas as informações, faz uma “delação póstuma”, na prática, pretende “sentenciar” no lugar do juiz. A solenidade científica do processo não pode se converter em uma espécie de “terapia de grupo”.
Questão de ordem em rumoroso processo criminal:
Findou a instrução em janeiro. Defesas aguardavam pela oportunidade de ofertar alegações finais, que seria seguida de sentença. Registra-se que em todas as audiências as defesas consultavam formalmente o Juiz Presidente, ladeado do MP, sobre existência ou não de tratativas/delações em andamento ou homologadas para se ter eventual acesso, em homenagem a ampla defesa, contraditório e, principalmente a lealdade processual e paridade de armas. Respostas do MP ao Juízo sempre no sentido de que “se existentes, eram sigilosas”.
Hora para outra, surgem notícias da existência e homologação desses novéis instrumentos (viciados na origem por “ecos de calabouços” e temores reverenciais), isto no contrafluxo de um processo criminal, em fase de alegações finais.
Como defensor de acusados não delatores, fiz oportuna questão de ordem na audiência, determinada de ofício pelo Juiz, para “reinterrogatórios” desses acusados delatores. Na arguição, verberamos contra manobra acusatória que se consubstanciou em verdadeira “instrução paralela”, que desnatura a “voluntas legis”, procurando emparedar a defesa em seu sagrado direito constitucional. Bradamos que os acusados “delatores”, cujos direitos foram respeitados, assistiram a todos os atos processuais de colheita de provas orais e interrogatórios dos corréus que, por não serem sigilosos, estavam disponíveis no sistema. Somente após isto selaram um acordo com o MP. Pelo inusitado, ousamos denominar “delação póstuma” que equivale a absurda “sentença de delator”, em interesses pessoais de delatores e acusadores formais, que não os da verdadeira e genuína justiça.
Fizemos constar que os “agora delatores” tiveram suas oportunidades, até seus interrogatórios para tanto e optaram pelo silêncio. No apagar das luzes do processo, curiosamente, optaram por esta forma inaceitável, que colhe de surpresa os demais acusados e suas defesas técnicas já estrategizadas ao longo do processo.
Alertamos tecnicamente ao Juízo, do risco da nulidade absoluta pelo evidente prejuízo real e institucional. Pedimos a suspensão do ato para retomar a fase do artigo 402 do CPP, e/ou fossem admitidos os demais acusados ao recinto da mesma audiência para tomarem conhecimento em nome da autodefesa, defesa técnica e seus corolários, e; acesso integral e efetivo aos áudios, vídeos e íntegras das mídias que compõe as delações, nas formas da Súmula Vinculante 14 do STF, sob pena de não podermos nos desincumbir do indeclinável direito de defesa com galhardia e eficiência.
Sentimos o temor e o tremor dos grandes cerceamentos. Não é esse o processo penal brasileiro concebido pelo quinto artigo da nossa Constituição Federal.
(Elias Mattar Assad, é advogado criminalista).