DIREITO PENAL NA LITERATURA: OS CRIMES LITERÁRIOS
DIREITO PENAL NA LITERATURA: OS CRIMES LITERÁRIOS
Direito Penal na Literatura constitui campo polissêmico que permitem articular ficção e realidade para discutir temas polêmicos a partir de obras literárias e legitimar a extraordinária importância da afinidade entre ambos. As temáticas dos capítulos, tão bem colocadas no livro, deixam margem para a imaginação do leitor e possibilita uma reflexão de que a pena, independente do cerceamento da liberdade. Extrapola o espaço físico e nos apena psicologicamente na nossa própria prisão onde a cela se transforma em uma cela de aula que nos ensina menos pela ciência e mais pela consciência (valores). Direito Penal na Literatura compartilha rea1lidade e suprarrealidade, arte e ciência que por vezes trocam de lugar ou se tornam parceiras como se pudessem anestesiar a alma de quem vive ou observa os contrastes de expressão da essência do SER que a realidade sufoca.
As temáticas propostas neste livro referentes à Abuso de autoridade, violação de Direitos Humanos, em Como bebem os Cães de Assis Brasil trazem narrativas do contexto da ditadura militar de 64 com o protagonista Jeremias sendo jogado no cárcere. Os capítulos da obra são A cela, O pátio e O grito como o momento em que relata o desespero dos prisioneiros antes de regressarem para suas celas.
Desistência voluntária discute aspectos na ótica do Direito Penal sobre fato recente envolvendo o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot e sua intenção de eliminar um Juiz do Supremo Tribunal, quando, voluntariamente, desiste de prosseguir em seu intento.
Evidências de Feminicídio e crimes passionais nas obras de Shakespeare onde é tomada a personagem Otelo de Shakespeare como base para a compreensão da recorrência desse crime e Graciliano Ramos na obra São Bernardo e Machado de Assis na obra Dom Casmurro exploram as relações afetivas enquanto atos, pensamentos e sentimentos transtornados pelo ciúme.
Autodefesa versus o (in) acesso à Educação analisa o capítulo “Cadeia” de vidas secas retrata cenas do cotidiano de um homem simples da roça, Fabiano que ao se manifestar, devolvendo provocações de um policial, enfrenta a arbitrariedade e o abuso de poder e cerceamento de defesa pela força policial. O contexto do fato se dá numa feira aonde os cidadãos simples do mato semanalmente vão à cidade para comprar mantimento e tomar uma pinga.
Direito sob a ótica literária nos faz refletir no processo de humanização do Direito através da ARTE, dentre outras da poesia. O lugar da poética no Direito coloca a ciência jurídica como fator de transformação do indivíduo uma vez que envolve valores como base da prática da justiça.
É preciso poetizar a prisão de si mesmo. A prisão do espírito para poder respirar longe da prisão real e mesmo que ela seja uma possibilidade, possa educar ou reeducar. A luta de Josef K pelo Direito discute a relação da Ciência do Direito com as demais ciências, como a sociologia, a psicologia, filosofia, dentre outras que, enquanto essa luta individual pelo Direito determinam implicações coletivas.
Condição análoga a de escravo, na obra Germinal levanta denúncia social, fortemente marcado pelo conflito de classes e a organização política e sindical dos trabalhadores das minas.
Direito Penal na Literatura desafia nossa capacidade de pensar e compreender a realidade num contexto social de profundas mudanças e caracterizado pela virtualidade, relativismo e complexidade.
O foco de análise das temáticas versam características de uma abordagem fenomenológica, psicológica e política que permite a crítica do objeto num sentido mais amplo, refutando-se a criação de uma norma única para diferentes abordagens.
Direito Penal na literatura em sua suprarrealidade contem uma essência virtual no sentido atribuído pelo filósofo francês Gilles Deleuse (1925-1995) no livro “Diferença e Repetição”. O termo virtual é usado não em oposição ao real, mas para uma compreensão ampliada da realidade para descrever multiplicidades, superando as noções da filosofia tradicional de possível real.
A leitura e a hermenêutica da sociedade e da sociedade do conhecimento, no Livro Direito Penal na Literatura, introduzem, dentre outras, a ideia de desconstrução contida no trabalho do filósofo francês Jacques Derrida, na década de 60 que em princípio exerceu influência através da teoria literária, principalmente com a escola de Yale com a participação de Paul de Man, Harold Bloom, J. Hillis Miller e Geoffrey Hartman e o próprio Derrida. A ideia de desconstrução não se refere ao oposto de construção ou no sentido de destruição, mas uma resposta filosófica a tendências como a fenomenologia de Husserl, o estruturalismo de Saussereano e a psicanálise de Freud e Lacan, no sentido de que na leitura desconstrutivista o significado nasce da diferença entre as palavras.
A interface de Direito Penal e literatura desafia o pensamento cômodo, colocando em xeque a verdade de uma realidade que não foi criada por DEUS, mas gerada pela falta de acesso ao Direito de todos usurpado por uma minoria ansiosa pela legitimação da dominação pela força de um status quo que sustenta privilégios passados de geração em geração.
A parceria Direito Penal e literatura provocam questões filosóficas que justificam e legitimam a ciência do Direito ao mesmo tempo em que a desafia. Direito Penal e Literatura é um processo ao mesmo tempo de autocrítica e compreensão de um contexto cultural hibrido de valores culturais, processos de dominação e libertação, luta e superação e põe à reflexão os questionamentos mais profundos do homem e da sociedade.
Prof. Dr José Ribamar Torres