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Impossibilidade de execução antecipada de pena contra advogado

Eis a questão inicial proposta:
Caso um advogado tenha contra si uma decisão condenatória confirmada pela segunda instância, mas ainda com recursos pendentes perante os tribunais superiores, pode ser determinada a imediata execução da pena contra ele?
Matteus Macedo e André Pontarolli

Com as recentes decisões do STF sobre a possibilidade de execução antecipada da pena, após o esgotamento do segundo grau de jurisdição (HC 126.292/SP; ARE 964.246/SP; ADC 43-MC/DF e ADC 44-MC/DF), diversas questões de alta indagação jurídica surgem a cada dia. Uma delas é a que se ocupa da aplicabilidade (ou não) de tais precedentes em caso de condenação de profissional da advocacia.
Neste artigo, abordaremos em primeiro lugar a (im)possibilidade de execução antecipada da pena de advogado à luz dos direitos específicos (prerrogativas), na forma do que estabelece a Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia). Em segundo lugar, trataremos do necessário respeito a outros direitos específicos, caso os tribunais firmem o errôneo entendimento de que é viável a execução antecipada.
Eis a questão inicial proposta:
Caso um advogado tenha contra si uma decisão condenatória confirmada pela segunda instância, mas ainda com recursos pendentes perante os tribunais superiores, pode ser determinada a imediata execução da pena contra ele?
À partida, insta salientar que, sendo o acusado advogado, deve ser observada a legislação pertinente, sobretudo as especifidades concernentes às hipóteses de cumprimento de pena ou prisão provisória. No caso, devem ser respeitados os ditames da Lei nº 8.906/1994.
Convém destacar que a Lei 8.906/1994 não foi objeto de análise nas recentes decisões proferidas pelo STF sobre execução antecipada de pena. Assim, tratando-se de legislação especial, os direitos nela inseridos não se encontram (e nem podem ser) relativizados, notadamente quando se trata de garantia fundamental referente ao bem jurídico liberdade. É incontroverso que a interpretação dos tribunais sobre norma geral não acarreta afetação negativa à norma especial. Feita esta ressalva inicial, é preciso, então, analisar a letra da lei:
De acordo com o art. 7º, V, o Advogado tem o direito de:

  • não ser recolhido preso, antes da sentença transitada em julgado, senão em Sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, e, na sua falta, em prisão domiciliar.

Ora, o Estatuto da Advocacia não admite execução antecipada de pena de Advogado, ao contrário, estabelece o pressuposto de que haja o prévio e necessário trânsito em julgado da sentença para que o profissional da advocacia seja preso, excepcionando-se apenas as prisões cautelares, nas hipóteses legais, em “sala de Estado Maior” ou em prisão domiciliar.
Importante ponderar que execução antecipada tem natureza jurídica de pena (ainda que aplicada a título precário) e não de prisão cautelar provisória. Desta forma, respeitando-se a lei especial, tal modalidade de prisão (execução provisória de pena) não pode atingir o Advogado, sob pena de vilipêndio das garantias legais inerentes à profissão.
Ressalta-se que, ao contrário do que prevê o art. 5º, LVII da Magna Carta, que aduz sobre não culpabilidade antes do trânsito em julgado[1], o art. 7º, V do Estatuto da Advocacia expressamente estipula que o advogado não pode ser preso, antes do trânsito em julgado, senão em “sala de Estado Maior”, ou na sua falta, em prisão domiciliar[2], somente nos casos de prisões cautelares (e não no caso de cumprimento, ainda que precário, de pena).
Dessa forma, não há que se cogitar um pretenso “efeito extensivo” do “novo” entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre condenações (não transitadas em julgado) de advogados, o que revelaria inconcebível construção analógica in malam partem (contrariando a lei especial, que sequer foi objeto de análise pelo STF).
Sedimentada a garantia do profissional da advocacia de não ser atingido pela prisão antecipada, é preciso cogitar, não obstante, a possibilidade de que os tribunais desrespeitem a lei especial e,  ampliando a interpretação do Supremo Tribunal Federal, passem a executar antecipadamente eventais penas contra advogado. Faz-se esta ponderação, pois, caso isto aconteça, outras garantias profissionais devem ser respeitadas, em vista das peculiaridades da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia).
Assim, na hipótese de ocorrer a execução antecipada, forçoso se revela o respeito à condição de advogado do acusado, a fim de que, em sendo recolhido preso, apenas o seja em “sala de Estado Maior” ou na falta desta, em prisão domiciliar. A lei é literal ao estabelecer esta garantia (antes do trânsito em julgado).
Com efeito, o STF já proferiu inúmeras decisões dando conta de que prisão especial não se confunde com prisão em “sala de Estado Maior”, a qual possui características extremamente peculiares, conforme se extrai do julgamento da Reclamação 4535/ES, relatada no STF pelo Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE:

  • “I. Reclamação: alegação de afronta à autoridade da decisão plenária da ADIn 1127, 17.05.06, red. p/acórdão Ministro Ricardo Lewandowski: procedência. 1. Reputa-se declaratória de inconstitucionalidade a decisão que – embora sem o explicitar – afasta a incidência da norma ordinária pertinente à lide para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição. 2. A decisão reclamada, fundada na inconstitucionalidade do art. 7, V, do Estatuto dos Advogados, indeferiu a transferência do reclamante – Advogado, preso preventivamente em cela da Polícia Federal, para sala de Estado Maior e, na falta desta, a concessão de prisão domiciliar. 3. No ponto, dissentiu do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 1127 (17.05.06, red. p/acórdão Ricardo Lewandowski), quando se julgou constitucional o art. 7, V, do Estatuto dos Advogados, na parte em que determina o recolhimento dos advogados em sala de Estado Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar. 4. Reclamação julgada procedente para que o reclamante seja recolhido em prisão domiciliar – cujo local deverá ser especificado pelo Juízo reclamado -, salvo eventual transferência para sala de Estado Maior. II. ‘Sala de EstadoMaior’ (L. 8.906, art. 7º, V): caracterização. Precedente: HC 81.632 (2ª T., 20.08.02, Velloso, RTJ 184/640). 1. Por Estado Maior se entende o grupo de oficiais que assessoram o Comandante de uma organização militar (Exército, Marinha, Aeronáutica, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar); assim sendo, ‘sala de Estado-Maior’ é o compartimento de qualquer unidade militar que, ainda que potencialmente, possa por eles ser utilizado para exercer suas funções. 2. A distinção que se deve fazer é que, enquanto uma “cela” tem como finalidade típica o aprisionamento de alguém -e, por isso, de regra contém grades -, uma ‘sala’ apenas ocasionalmente é destinada para esse fim. 3. De outro lado, deve o local oferecer ‘instalações e comodidades condignas’, ou seja, condições adequadas de higiene e segurança”.

Destarte, ressalta-se que, na ausência de “sala de Estado-Maior”, indispensável a conversão da prisão não definitiva do advogado em prisão domiciliar, conforme orientação firme do STF:

  • PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SÚMULA 691 DO STF. SUPERAÇÃO. POSSIBILIDADE. FLAGRANTE ILEGALIDADE. PRISÃO CAUTELAR. ADVOGADO. ESTATUTO DA ADVOCACIA. ART. 7, V, DA LEI 8.906/94. SALA DE ESTADO MAIOR. INEXISTÊNCIA. PRISÃO DOMICILIAR. GARANTIA. ORDEM CONCEDIDA. 1. É garantia dos advogados, enquanto não transitada em julgado a decisão condenatória, a permanência em estabelecimento que possua Sala de Estado Maior. 2. Inexistindo Sala de Estado Maior na localidade, garante-se ao advogado seu recolhimento em prisão domiciliar. 3. Caracterizada, no caso, a flagrante ilegalidade, que autoriza a superação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal. 4. Ordem concedida.” (STF, HC 96539, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, julgado em 13/04/2010, DJe-081, de 07/05/2010, p. 402).

Portanto, no caso de seguimento da execução antecipada contra advogado, ao arrepio da lei, devem ser respeitadas todas as garantias do profissional da advocacia, a fim de que, em sendo recolhido preso, o seja em “sala de Estado Maior”, conforme descrição dada pela jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ou em prisão domiciliar, em caso de inexistência da primeira.
Matteus Beresa de Paula Macedo
Advogado Criminal
Pós-graduando em Direito Penal
André Luis Pontarolli
Coordenador Geral da Sala de Aula Criminal
Professor de Direito Penal e Criminologia
Advogado Criminal
[1]Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”
[2] São direitos do advogado; (…) não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, e, na sua falta, em prisão domicilia
Fonte: http://www.salacriminal.com/

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