MEDIDA PATERNALISTA – Proibição de ingerir bebidas alcoólicas não pode ser condição do sursis
Não é função do magistrado tutelar a integridade física e a saúde de quem está em liberdade, não sendo aceitável qualquer espécie de medida judicial de caráter meramente moral sem previsão legal.
Com esse entendimento, a 3ª Turma Recursal de Florianópolis decidiu excluir a proibição genérica de ingerir bebida alcoólica como condição especial do sursis. A decisão se deu por maioria, vencido o relator.
No caso, um homem teve sua pena substituída pelo sursis com a imposição de algumas condições, dentre elas a proibição de ingestão de bebidas alcoólicas. A condição foi questionada pelo réu.
Em sede de apelação, a Turma Recursal afirmou que o artigo 79 do Código Penal, ao autorizar a fixação de outras condições em face da concessão do sursis, não conferiu ao julgador o direito de impor restrições em descompasso com a proporcionalidade da condição e o contexto do caso.
“A cisão entre Direito e Moral impede que iniciativas moralizantes possam se valer de espaços de poder para impor, por meio de decisões judiciais, a vedação ao exercício de direitos que podem fazer mal ao agente, isto é, mostra-se vedada a proibição genérica do uso de drogas, de álcool, de comida, enfim, de qualquer ação que esteja no espectro da liberdade do agente. Do contrário, teríamos o protagonismo da arbitrariedade judicial, criando-se restrições não previstas em lei (taxatividade penal)”, diz trecho da decisão.
Para o juízo, as condições impostas pelo sursis devem guardar correlação/nexo com o fato imputado e não podem ser universais, ou seja, devem ter relação com a narrativa da denúncia. No caso, em nenhum momento a denúncia refere-se ao fator “álcool”.
Citando a doutrina, a decisão ressaltou que, quando o Estado faz uso do ordenamento jurídico para interferir na liberdade individual, para promover um bem ou evitar um mal, contra a vontade da pessoa, por entender que esta desconhece o melhor para si própria, ocorre o paternalismo.
“Aceitar a proibição genérica de ‘consumo de álcool’ significaria, na hipótese de manutenção, a prevalência da postura paternalista, desprovida de suporte democrático, justamente por avançar sobre o espaço de liberdade (autonomia privada) do sujeito, sem autorização legal.”
Por ausência de previsão em lei e pelo moralismo ser insuficiente para legitimar medidas de natureza penal, uma vez que é intrínseco ao Estado Democrático de Direito a necessidade de mínima criação de perigo ao bem tutelado, o Poder Judiciário não pode impor a proibição genérica e universal ao consumo de álcool, concluiu a Turma Recursal.
0005041-26.2016.8.24.003
Conjur