O AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ DO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES PARA FINS DE PROGRESSÃO DE REGIME
O AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ DO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES PARA FINS DE PROGRESSÃO DE REGIME
Por Carlo Velho Masi [1]
A Lei 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) trouxe diversas inovações à legislação penal e processual penal brasileira e seus impactos ainda serão estudados por muitos anos pela doutrina das ciências criminais.
Embora ainda pouco explorada e sem maior ressonância nos tribunais, uma das importantes alterações promovidas por esta legislação diz respeito à execução das penas privativas de liberdade relacionadas ao crime de tráfico ilícito de entorpecentes (art. 33, caput, da Lei 11.343/2006), delito que mais encarcera pessoas hoje no país e responsável por toda uma criminalidade violenta que o circunda. Conforme dados do INFOPEN de dezembro de 2020, do total da população carcerária brasileira de 811.707 presos, o número de pessoas vinculadas ao tráfico de drogas chegou a 246.091, ou seja, ultrapassou 30% do total de tipos penais que ensejam prisões no Brasil[2].
Conquanto exista todo um discurso moralizante no que tange às drogas e que muitos considerem o tráfico um crime de elevada repulsa social, analisando as mudanças que a Lei Anticrime promoveu na Lei dos Crimes Hediondos e na Lei de Execução Penal, é forçoso reconhecer que o legislador pátrio deixou de equiparar o crime de tráfico a crime hediondo, ao menos para fins de progressão de regime. Tal constatação, que ainda pende de reconhecimento pelas Cortes Superiores, tem o potencial de causar uma repercussão marcante em nosso sistema carcerário, hoje caracterizado pelo “estado de coisas inconstitucional”, na ótica do STF (ADP 347).
Segundo o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, o crime de tráfico de drogas é apenas inafiançável e insuscetível de graça ou anistia e não se confunde com “os definidos como crimes hediondos”, categoria jurídica própria.
O rol de crimes hediondos foi previsto pela Lei 8.072/1990 e tanto em sua redação originária, quanto após a reforma operada pela Lei Anticrime (na qual o legislador expressamente incluiu novos delitos como hediondos[3]), não abrangeu o tráfico de drogas.
Nem mesmo no parágrafo único do art. 1º da Lei 8.072/1990, onde constam crimes que “consideram-se também hediondos”, está previsto o crime de tráfico ilícito de entorpecentes.
O art. 2º da Lei dos Crimes Hediondos é o único dispositivo que prevê o crime de “tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins” e o considera insuscetível de (I) anistia, graça e indulto; e (II) fiança.
Além disso, segue previsto neste artigo que a pena será cumprida em “regime inicialmente fechado” (§1º); que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade (§2º); e que a prisão temporária terá o prazo de 30 dias, prorrogável por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade (§3º).
Note-se, porém, que o parágrafo que anteriormente previa as frações para progressão de regime (§2º) foi expressamente revogado pelo legislador reformista. Eis as redações anteriores, hoje revogadas:
Redação dada pela Lei nº 11.464, de 2007: § 2o A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente[4].
Redação dada pela Lei nº 13.769, de 2018: § 2º A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal).
Portanto, percebe-se que houve uma intenção manifesta do legislador de não mais regular na Lei dos Crimes Hediondos as frações (hoje percentuais) para progressão de regime nos crimes hediondos e equiparados.
Outrossim, não existe mais qualquer dispositivo legal que preveja que o tráfico ilícito de entorpecentes terá um parâmetro específico e mais rígido que os crimes comuns para a progressão de regime.
Em outras palavras, o legislador não fixou parâmetros próprios para a progressão de regime no crime de tráfico de drogas.
A antiga redação dada pela Lei nº 13.769, de 2018 – revogada pela Lei nº 13.964, de 2019 – fazia expressamente uma equiparação do tráfico com a hediondez para fins de progressão de regime. Hoje, porém, esta equiparação não existe mais no ordenamento pátrio.
A única disposição que segue vigente, como visto, é a vedação de anistia, graça, indulto e fiança (que inclusive está prevista constitucionalmente e encontra correspondência no art. 44 da Lei 11.343/2006[5]).
Porém, analisando cuidadosamente a legislação vigente, não há mais norma que equipare o tráfico de drogas a crime hediondo para fins exclusivos de imposição de percentuais diferenciados para progressão de regime.
Ora, a decorrência natural disso é que o intérprete da lei penal que não pode criar interpretações que prejudiquem a situação do acusado/apenado.
A Lei Anticrime reformulou totalmente o art. 112 da LEP, criando percentuais específicos para progressão de regime a depender da espécie delitiva praticada.
No §5º deste dispositivo, o legislador afastou a hediondez do chamado “tráfico privilegiado”: “§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006”.
Veja-se que nenhum outro dispositivo da LEP faz alusão ao crime de tráfico de drogas.
Portanto, urge concluir que houve uma alteração da lei penal em benefício do apenado, qual seja, o afastamento da hediondez do tráfico de drogas para fins de aferição do percentual para progressão de regime.
Quando o art. 112 da LEP fala em “crime hediondo ou equiparado” (incisos V, VI, VII e VIII) não especifica quais seriam estes delitos “equiparados a hediondos”.
O certo é que a Lei 8.072/1990 não inclui o tráfico de drogas em seu rol de crimes hediondos e, hoje, após a alteração da Lei Anticrime, só o equipara aos delitos lá previstos no tocante a benefícios na execução (anistia, graça e indulto) e fiança.
Trata-se apenas de atribuição de vedações específicas, e não de uma equiparação total que possa ser ampliada para os percentuais de progressão de regime na execução.
Nenhum diploma legislativo chega a elencar efetivamente quais delitos seriam “equiparados aos hediondos”, seja a Constituição Federal, a Lei dos Crimes Hediondos, a Lei de Execuções Penais ou a Lei de Drogas.
Ora, nos termos do art. 5º, XXXIX e XL, deverá o intérprete da lei penal atentar-se para o princípio da legalidade (“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”) e da irretroatividade da lex gravior (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”). Tais princípios são reiterados nos artigos 1º e 2º, parágrafo único, do Código Penal:
Art. 1º – Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
Art. 2º, Parágrafo único – A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
A lei que, em matéria de execução penal, beneficia o apenado sem a menor dúvida deve retroagir para abarcar situações pretéritas.
Ademais, em se tratando de matéria penal, em que vige o princípio da reserva legal, o conceito de “crime equiparado a hediondo” não pode ser resultado de mera interpretação teleológica ou analogia, mas deve encontrar seu conteúdo expresso em mandamento legal.
Em brilhante estudo sobre a temática aqui tratada, os defensores públicos Érico Ricardo da Silveira e Felipe de Mattos Takayassu, assim concluem:
[…] o caráter hediondo de um delito (ou sua equiparação), considerando as repercussões penais dessa qualidade, somente pode ser etiquetado pelo legislador, em rol expresso e taxativo.
Ademais, o constituinte (art. 5º, XLIII, CF/88) e o legislador (art. 2º, §2º, da Lei nº 8.072/1990), ao colocarem os delitos de “tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo” ao lado dos delitos hediondos, por exclusão lógica, definiu que esses três delitos não são hediondos.
Do mesmo modo, não houve, por parte do constituinte, “equiparação” aos delitos hediondos, visto que apenas se atribuiu determinadas características comuns a todos eles, em claro exemplo de silêncio eloquente.
Assim, por não existir um rol constitucional/legal de delitos “equiparados” a hediondo (única forma possível de estabelecimento), qualquer norma extensiva nesse sentido deverá ser expressa e específica[6].
Da mesma forma, entendemos que o silêncio do legislador ao tratar do tráfico de drogas não pode ser interpretado em desfavor do apenado.
Quando o legislador pretende equiparar totalmente (“para todos os efeitos”) um delito aos crimes hediondos, o faz expressamente. É o que se verifica, exemplificativamente, no caso do delito de terrorismo (art. 17 Lei de 13.260/16[7]). Contudo, previsão semelhante inexiste na na Lei 11.343/2006.
A existência de características em comum entre os delitos “hediondos” e o tráfico de drogas não autoriza o intérprete a concluir pela equiparação total.
Novamente a título exemplificativo, observa-se que em todos os crimes contra a liberdade sexual e crimes sexuais contra vulnerável (capítulos I e II do Título VI do Código Penal) procede-se mediante ação penal pública incondicionada, de acordo com o art. 225 do Código Penal. Nada obstante, o fato destes crimes possuírem esta característica em comum não os equipara totalmente, visto que alguns são hediondos e outros não, de sorte que o tempo de cumprimento de pena para progressão varia entre eles.
A alteração legal que afastou a hediondez ou equiparação do “tráfico privilegiado” no §5º do art. 112 da LEP – mudança que apenas absorveu o que a jurisprudência já vinha reconhecendo[8] – nada diz com relação ao crime de tráfico do caput do art. 33 da Lei 11.343/2006. Deste modo, tal desequiparação expressa não exclui a desequiparação tácita por ausência de disposição legal, na medida que uma norma específica que beneficia o apenado não pode ser interpretada para fins de prejudicá-lo.
A jurisprudência do STF vem entendendo há muito que o silêncio normativo deve ser saneado em atenção aos princípios norteadores da hermenêutica penal, cumprindo observar a proscrição à analogia in malam partem. Foi o que decidiu a Suprema Corte quando deparou-se com o art. 112, VII, da LEP e decidiu pela impossibilidade de aplicar ao reincidente não específico o patamar de progressão de 60%:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. CONDENADO POR CRIME HEDIONDO OU EQUIPARADO REINCIDENTE POR CRIME COMUM. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA. LEI 13.964/2019. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS OBJETIVOS PARA A PROGRESSÃO DE REGIME. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAR AO REINCIDENTE NÃO ESPECÍFICO O PATAMAR DO ART. 112, VII DA LEP. PROSCRIÇÃO À ANALOGIA IN MALAM PARTEM. PRINCÍPIO DO FAVOR REI. ANTE À LACUNA LEGAL INCIDE A NORMA MAIS FAVORÁVEL AO APENADO. ART. 112, V, DA LEP. ANALOGIA IN BONAM PARTEM. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO A FIM DE ESTABELECER O PATAMAR MAIS BENÉFICO À PROGRESSÃO DE REGIME DO RECORRENTE. 1. A Constituição da República (art. 5°, XXXIX) assegura que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, postulado que exige a subsunção estrita das condutas e das sanções criminais à moldura normativa. 2. A Lei 13.964/2019, ao alterar o art. 112 da LEP, não tratou, de forma expressa, das condições para progressão de regime do condenado por crime hediondo ou equiparado reincidente em crime comum, somente disciplinando a gradação da reprimenda do apenado primário (inciso V) e do reincidente específico (inciso VII). 3. O silêncio normativo, contudo, deve ser saneado em atenção aos princípios norteadores da hermenêutica penal, cumprindo observar a proscrição à analogia in malam partem. 4. Havendo dois incisos que, por analogia, poderiam ser aplicados ao apenado (no caso, o inciso V e o inciso VII), o dispositivo mais benéfico ao acusado (inciso V) é a única solução possível, pois a adoção do critério mais gravoso inevitavelmente importaria afronta ao princípio da vedação à analogia in malam partem e do favor rei. Doutrina. 5. Recurso ordinário em habeas corpus a que se dá provimento a fim restabelecer a decisão de 1º grau, que aplicou ao apenado o patamar mais benéfico para a progressão de regime (art. 112, inciso V, da LEP). (STF, RHC 200879, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 24/05/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-113, DIVULG 11-06-2021PUBLIC 14-06-2021)
A Corte também reconheceu a repercussão geral desta matéria sob o Tema 1.169, com a seguinte redação:
Tendo em vista a legalidade e a taxatividade da norma penal (art. 5º, XXXIX, CF), a alteração promovida pela Lei 13.964/2019 no art. 112 da LEP não autoriza a incidência do percentual de 60% (inc. VII) aos condenados reincidentes não específicos para o fim de progressão de regime. Diante da omissão legislativa, impõe-se a analogia in bonam partem, para aplicação, inclusive retroativa, do inciso V do artigo 112 (lapso temporal de 40%) ao condenado por crime hediondo ou equiparado sem resultado morte reincidente não específico.
Nesta mesma senda, o STJ entendeu por afastar a hediondez do crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006), uma vez que este não está expressamente elencado no rol do artigo 2.º da Lei n.º 8.072/1990[9].
Ainda, ao deparar-se com a alteração do parágrafo único do art. 1º da Lei dos Crimes Hediondos, que passou a prever como “também hediondo” o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido (16 da Lei nº 10.826/2003), o STJ reconheceu a natureza não hedionda do porte ou posse de arma de fogo de uso permitido com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado, consignando que “diante de texto legal obscuro – como é o parágrafo único do art. 1.º da Lei de Crimes Hediondos, na parte em que dispõe sobre a hediondez do crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo – e de temas com repercussões relevantes, na execução penal, cabe ao Julgador adotar postura redutora de danos, em consonância com o princípio da humanidade”[10].
Ora, se, diante daquelas omissões legislativas, entenderam as Cortes Superiores pela aplicação da analogia in bonam partem e pela incidência dos princípios da legalidade, taxatividade e retroatividade da lei mais benéfica, também no caso do afastamento da hediondez do tráfico ilícito de entorpecentes para fins de progressão de regime deverão ser aplicados estes mesmos parâmetros hermenêuticos.
A lacuna legislativa aqui apontada não se pode admitir a aplicação de norma mais gravosa a partir de uma interpretação prejudicial ao condenado.
A Lei 13.964/2019 afigura-se, neste ponto, mais benéfica, revogando o dispositivo que disciplinava, de forma equiparada, as frações de cumprimento de pena para fins de progressão de regime nos crimes hediondos, na prática da tortura, no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e no terrorismo (art. 2º, §2º, da Lei 8.072/90).
Caberá, pois, ao Juízo da Execução, “aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado” (art. 66, I, da LEP)[11].
Consequentemente, o condenado pela prática do crime de tráfico de drogas deverá progredir conforme os critérios objetivos dos delitos comuns (incisos I a IV do art. 112 da LEP), eis que não são se trata de “crime hediondo ou equiparado”:
I – 16% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II – 20% da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça (até 22/01/2020, dia anterior à entrada em vigo da Lei Anticrime, aplica-se a fração até então prevista na LEP de 1/6, ou 16,66%, pois mais benéfica ao apenado);
III – 25% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça (vide art. 40, IV, da Lei 11.343/2006);
IV – 30% da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça.
O inciso VII do art. 112 da LEP também não é mais aplicável ao crime de tráfico, pois aquele que foi condenado por este delito e posteriormente praticou outro crime de tráfico em nenhuma destas situações terá praticado “crime hediondo ou equiparado”.
Ademais, em relação ao livramento condicional, aplicar-se-á o disposto no art. 83 do Código Penal:
Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:
I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;
II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;
Logo, o afastamento da hediondez do tráfico para fins de progressão é uma conclusão lógica que exsurge da análise das alterações promovidas pela Lei Anticrime. Diante disso, deverá o operador do Direito valer-se dos princípios de hermenêutica constitucional incidentes, sendo inolvidável a retroatividade desta desequiparação, tese recentemente reconhecida por magistrada da 1ª Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre/RS e que ainda deverá ser submetida ao Superior Tribunal de Justiça e, quiçá, ao Supremo Tribunal Federal.
Tal alteração pode constituir-se num importante passo para mudar a direção da política criminal irracional de “combate” às drogas que vige no Brasil nas últimas décadas, resultado de uma importação historicamente irrefletida e dissonante do nosso cenário sócio-político e econômico. O possível enxugamento da massa carcerária resultante da redução dos patamares para progressão de regime nos crimes de tráfico de drogas teria a propensão de reduzir a velocidade do crescimento de um sistema prisional há muito falido e injusto/desigual, responsável por uma violação sistemática de direitos humanos que apresenta o Brasil como um país em que direitos e garantias individuais são privilégios de alguns e meras promessas para a maioria.
[1] Advogado criminalista (OAB-RS 81.412). Vice-presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas no Estado do Rio Grande do Sul (ABRACRIM-RS). Mestre e Doutorando em Ciências Criminais pela PUC-RS. Especialista em Direito Penal e Política Criminal: Sistema Constitucional e Direitos Humanos pela UFRGS. Especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra/IBCCRIM. Especialista em Ciências Penais pela PUC-RS. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela UNISINOS. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC-RS. Membro da Comissão Nacional de Judicialização e Amicus Curiae da ABRACRIM. Parecerista da Revista Brasileira de Ciências Criminais (RBCCRIM) e da Revista de Estudos Criminais do ITEC. Moderador do Grupo de Estudos em Processo Penal da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB-RS. Coordenador do Grupo de Estudos Avançados Grupo de Estudos Avançados Lei Anticrime: aspectos penais, processuais penais e criminológicos, do IBCCRIM-RS. Coordenador Estadual Adjunto do IBCCRIM no Rio Grande do Sul. Membro da Associação das Advogadas e dos Advogados Criminalistas do Estado do Rio Grande do Sul (ACRIERGS). Escritor, pesquisador e palestrante na área das Ciências Criminais. Professor convidado em diversos cursos de pós-graduação. E-mail: carlo@camargomasi.com.br. Instagram: @carlo_velho_masi. www.camargomasi.com.br
[2] Disponível em: <https://www.gov.br/depen/pt-br/sisdepen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-analiticos/br/brasil-dez-2020.xls>. Acesso em 03 nov. 2021.
[3] Roubo circunstanciado pela restrição de liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V, do CP); roubo circunstanciado pelo emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I, do CP) ou pelo emprego de arma de fogo de uso proibido ou restrito (art. 157, § 2º-B, do CP); roubo qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte (art. 157, § 3º, do CP); furto qualificado pelo emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum (art. 155, § 4º-A, do CP).
[4] Norma que inclusive foi considerada, à época, mais gravosa, não se aplicando retroativamente, como ficou sedimentado pela Súmula 471 do STJ: “Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n. 11.464/2007 sujeitam-se ao disposto no art. 112 da Lei n. 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) para a progressão de regime prisional”. (TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/02/2011, DJe 28/02/2011).
[5] Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico.
[6] SILVEIRA, Érico Ricardo da; TAKAYASSU, Felipe de Mattos. Tráfico de drogas e progressão de regime: a lei anticrime e a não hediondez do delito. CONJUR, São Paulo, 18 mai. 2021. Disponível em: <https://bityli.com/1AMlJc>. Acesso em 02 nov. 2021.
[7] Art. 17. Aplicam-se as disposições da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, aos crimes previstos nesta Lei.
[8] HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL, PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.072/90 AO TRÁFICO DE ENTORPECENTES PRIVILEGIADO: INVIABILIDADE. HEDIONDEZ NÃO CARACTERIZADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O tráfico de entorpecentes privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.313/2006) não se harmoniza com a hediondez do tráfico de entorpecentes definido no caput e § 1º do art. 33 da Lei de Tóxicos. 2. O tratamento penal dirigido ao delito cometido sob o manto do privilégio apresenta contornos mais benignos, menos gravosos, notadamente porque são relevados o envolvimento ocasional do agente com o delito, a não reincidência, a ausência de maus antecedentes e a inexistência de vínculo com organização criminosa. 3. Há evidente constrangimento ilegal ao se estipular ao tráfico de entorpecentes privilegiado os rigores da Lei n. 8.072/90. 4. Ordem concedida. (STF, HC 118533, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 23/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-199DIVULG 16-09-2016PUBLIC 19-09-2016)
[9] STJ, HC 537.943/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 26/11/2019.
[10] STJ, HC 525249 / RS, Relator(a) Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, Data do Julgamento: 15/12/2020, Data da Publicação/Fonte: DJe 18/12/2020.
[11] Súmula 611 do STF: Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.