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O PAPEL DA MULHER NO CAOS POETISAS DA VIDA

O PAPEL DA MULHER NO CAOS POETISAS DA VIDA

Bianca Rosenthal [1]

O presente artigo tratará do papel da mulher no caos, especificamente na pandemia da COVID-19 que estamos enfrentando atualmente.

Os impactos da pandemia refletem diretamente na saúde, na economia, nos empregos e nas emoções. E, as mulheres, certamente são as mais afetadas no contexto geral do problema.

É grande o sofrimento de muitas mulheres no cenário atual, no qual ficou evidente o aumento da violência doméstica, a necessidade de dar conta de tudo, desde a preocupação e o suporte para os filhos em suas aulas on-line confinados dentro de casa, os afazeres domésticos, o sustento da família (muitas mulheres são as únicas ou as maiores provedoras do lar), a preocupação com os seus entes queridos e que fazem parte do grupo de risco, quer seja pela idade ou pelas doenças preexistentes, enfim, um acúmulo de atribuições que levam ao esgotamento físico e mental não raras vezes.

Certamente, as mulheres pobres e negras são as que mais sofrem. Fico imaginando as dificuldades daquelas que moram em favelas, em locais sem saneamento básico e sem o mínimo de estrutura, sem dignidade de moradia. A tristeza e a impotência de não conseguirem atender às necessidades de seus filhos, que na maioria das vezes sequer conseguem estudar em casa, por não terem acesso à internet ou não disporem de computadores e celulares que permitam acesso às aulas on-line com a mínima condição de aproveitamento do conteúdo ensinado. E aí, entra uma série de outros problemas. As dificuldades são tantas que, o uso de máscara e o distanciamento social, muito mais complicado em comunidades carentes, acabam por serem deixados de lado, de modo que a contaminação é mais latente e os recursos precários para o tratamento.

Para nós, mulheres que puderam ter acesso a uma boa educação, uma boa profissão, um lar digno para morar, a situação é bastante difícil, quanto mais para aquelas que vivem em condições precárias de saúde, educação e moradia.

Os abalos psicológicos são imensos em qualquer classe social, mas as que contam com melhores condições financeiras podem ter acesso a um digno tratamento médico e psicológico. Da mesma forma, em que pese o nosso Sistema Único de Saúde (SUS) dispor gratuitamente de acesso à saúde, o sistema não é igualmente eficaz nas diversas regiões e cidades de nosso País, sendo que novamente os ricos têm acesso a um tratamento de saúde muito mais digno e eficaz.

No entanto, o cerne deste meu artigo é levar à reflexão de que, nós mulheres, podemos fazer a diferença na vida das pessoas, no mundo. É um trabalho árduo e contínuo, mas podemos e devemos aprender a fazer poesia no caos, a gerenciar nossas emoções, trabalhando na construção de um mundo melhor. Utopia? Não. Mas um verdadeiro desafio!

As mulheres representam a parte mais sensível da humanidade, de modo que costumam ser mais generosas, mais solidárias e altruístas. Por isso, muitas vezes, acabam pagando um preço caro, deixando de lado projetos pessoais, sentindo-se culpadas ao dedicarem um tempo para cuidar da saúde, fazerem exercícios físicos, cuidarem da beleza.

Contudo, esses conceitos devem ser revistos. As mulheres precisam estar bem fisicamente e emocionalmente para darem conta de tantas atribuições e responsabilidades. E, para estarem bem, precisam dedicar tempo a elas mesmas, desenvolverem a autoestima, serem um pilar de sustentação para as suas famílias. Quanta responsabilidade e quanta beleza também existem nisto tudo!

“A mulher sábia edifica a sua casa, mas com as próprias mãos a insensata derruba a sua”. [2]

A citação acima, independente da crença religiosa, traz uma reflexão bastante instigante, sobre o poder de uma mulher edificar ou destruir o seu lar.

Claro que, mais uma vez, é importante destacar que a situação das mulheres é diferente, conforme a classe social, a cor da pele, entre outras desigualdades, mas é fato a existência do poder transformador da mulher. Somos poetisas da vida.

Assim, num cenário de pandemia ou de caos, devemos focar no poder transformador das mulheres. Mães dedicadas, profissionais capacitadas, lutadoras contra as desigualdades, promotoras da humanidade.

As ações sociais são fundamentais para o bem-estar da coletividade, sendo que o fortalecimento da voz da mulher no combate à violência e às injustiças sociais é essencial cada vez mais. A mulher é especialista em enxergar oportunidade onde muitos só veem problemas.

Sem gestão da emoção, divergências se tornam confrontos desnecessários, mas a mulher tem o poder de desarmar os adversários, com o carisma, com a inteligência (principalmente a inteligência emocional), com a garra de quem não desiste jamais.

No entanto, a melhor das armas é a educação, o conhecimento. As mulheres devem e precisam saber contar umas com as outras, levando informação e capacitação para aquelas mais desfavorecidas pelo sistema.

As frentes que a mulher pode atuar são muitas, somar forças, a chamada “sororidade”, ou seja, a união entre as mulheres e o fim da rivalidade feminina.

Muito há de ser trabalhado em termos de feminismo. Há muito a se aprender e a se defender. Muitas de nós temos ideias preconcebidas e equivocadas sobre o verdadeiro feminismo.

A voz de quem clama por igualdade de direitos, por respeito e dignidade, pode ser uma voz entoada na melodia de um coro cada vez maior e mais sincronizado, no combate a todo e qualquer preconceito e na valorização dos direitos humanos. As mulheres são guerreiras fortes e extremamente sensíveis, humanas, resilientes.Contudo, a maioria não tem acesso às informações necessárias, à segurança e dignos salários. Num cenário pandêmico, a situação agrava-se. E isso deve mudar.

No mercado de trabalho, muitas mulheres têm ganhado cada vez mais espaço, exercendo papéis tão ou mais importantes do que os homens. Governos que contam com a liderança de mulheres têm se destacado no cenário mundial de combate à pandemia e outros problemas sociais. A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, é um ótimo exemplo nesta questão, sem falar da solidariedade e da humanidade no trato dos familiares das vítimas e da situação como um todo.

É importante levar para as mulheres de todas as classes sociais programas que as capacitam intelectual e emocionalmente.

O acesso a programas assim é muito mais complicado para as mulheres que vivem à margem da sociedade, mas é possível fazer com a união de esforços com objetivos comuns.

Uma questão de extrema relevância em tempos como os de hoje, é a questão da saúde mental. Os índices são surpreendentes. O aumento de casos de transtornos emocionais, tais como a ansiedade, o estresse, a depressão, e, infelizmente o aumento de suicídios, demonstra que há muito trabalho a ser feito, que a humanidade está adoecendo rápido e coletivamente.

É importante dar o peixe para quem tem fome, mas é de importância ímpar ensinar a pescar. E, ensinar a pescar metaforicamente falando, é capacitar, é permitir o desenvolvimento da autoestima, é ensinar ferramentas e técnicas de gestão emoção, é trabalhar a valorização da mulher, é ensinar habilidades socioemocionais, é dar educação.

Muitas mulheres não sabem o potencial que têm. É preciso trabalhar e muito isso. Repito, somos poetisas da vida! Extraímos beleza da dor, fazemos as coisas com amor, abdicamos, choramos, rimos, apesar de muitas vezes deixarmos de lado os nossos interesses pessoais em prol da família, do trabalho e da sociedade.

Devemos nos apoiar sempre. Conhecer as leis e os programas de proteção às mulheres. Temos um papel fundamental no caos. Conseguimos trazer mais equilíbrio, mais harmonia, mais alegria. Não é fácil! Mas somos fortes e juntas somos ainda mais.

Por estar relacionado ao tema proposto, nada melhor do que trazer um pouco de poesia:

Ruínas e castelos – metamorfoses[3]

Na vida às vezes desmoronamos

Perdemos quem amamos

Sofremos

Fracassamos

Ruínas

Grandes ruínas

Mas daí como um milagre

Nossos pedaços

Recolocam-se

Em outras partes

Transformam-se

E aos poucos

Castelos vão sendo levantados

Verdadeiras fortalezas

Que já não expõem

Nossas fraquezas

Castelos

Belos castelos

Mas a vida é sempre assim

Com ruínas e castelos

Momentos tristes

Momentos belos

A diferença está no modo como

Lidamos com cada fase

Cada uma tem sua chave

Homenagens e despedidas

Aceitação e superação

E recordações para toda a vida.

Aprendemos que chorar faz bem
De dor, de emoção,
Da dor extrai-se grande lição
Supere-se, preste atenção.
Errou? Todos erram!
O que fazer com os erros é o que importa.

As mulheres e a poesia! Quanta riqueza e quanto aprendizado nas metamorfoses da vida! Depois do mais rigoroso inverno, é que nascem as mais belas flores.

A capacidade das mulheres se reerguerem é incrível. Mas, não podemos deixar de lado jamais aquelas que se encontram à margem da sociedade, as que sustentam sozinhas as suas famílias, as que não tiveram condições de denunciarem os parceiros agressivos, as que são assediadas no trabalho simplesmente por serem mulheres, as que mais sofrem em situações de calamidade tais qual a pandemia da Covid-19.

Nós, as mulheres formadoras de opinião, que tivemos condições de ter uma boa educação, conhecer e defender os nossos direitos, temos um papel fundamental no caos, quer seja na pandemia, quer seja na defesa dos direitos humanos, quer batalhando no feminismo em sua essência.

Cabe a nós, entre aconselhamentos e terapias, entre estudos e aprendizados, levar a todos, especialmente a outras mulheres, a visão de um mundo melhor e a necessidade de trabalharmos em prol disso.

O aprofundamento de pautas feministas é muito relevante, mas cada uma de nós pode contribuir com algo de maior especialidade ou entendimento.

A preocupação quanto à prevenção de transtornos emocionais deve ser uma pauta de destaque. Se as mulheres não estiverem bem do ponto de vista emocional, pouca força sobra para lutarem por seus direitos.

Uma contribuição neste tema de prevenção é saber que existem serviços e programas de prevenção aos transtornos emocionais de forma gratuita.

No ano de 2015 foi iniciada no Brasil a campanha de prevenção ao suicídio denominada “Setembro Amarelo”. Essa campanha foi uma iniciativa do [4]CVV (Centro de Valorização da Vida), um trabalho voluntário que atende por telefone no número 188, além de atendimentos por e-mail e outros canais.

O trabalho do CVV é um trabalho de apoio nos focos de tensão, quando pessoas se percebem desorientadas, com pensadores perturbadores.

Ainda existe muito tabu e muito preconceito quando o assunto é transtorno emocional. O conhecimento é umas das mais importantes armas de prevenção de transtornos emocionais e suicídio.

O Dr. Augusto Cury, psiquiatra e escritor publicado no mundo todo, desenvolveu um programa 100% gratuito de prevenção de transtornos emocionais, denominado [5]Você é Insubstituível, uma espécie de vacina emocional. Prevenir é essencial.

No que consiste esse programa? É uma série com 04 episódios, contendo ferramentas psicológicas que ajudam a desenvolver habilidades emocionais, promovendo autoestima, construção de relações saudáveis e o desenvolver de um pensar mais crítico diante da vida.

Dada à importância, o programa conta com o apoio do Ministério da Justiça, do Serviço Público Federal, da Associação dos Magistrados Brasileiros, da Polícia Militar do Estado de São Paulo e vários outros órgãos.

A gestão da emoção nos capacita a lidar com as intempéries da vida, como é o caso da pandemia.

Há muito a ser feito. Outra questão importante a ser trabalhada diz respeito aos padrões ditatoriais de beleza. E, agora, com o acúmulo de atribuições na quarentena, muitas mulheres têm se achado feias, por não terem tempo de se arrumarem, ou até vontade para isso, enquanto muitas “lives” com blogueiras altamente produzidas continuam em evidência.

Ora, toda mulher é única. Cada qual traz sua singularidade. A feminilidade da mulher fascina, ou seja, o modo de ser, de viver, de pensar, atributos que envolvem o ser feminino.

A mulher, para ser bonita, não precisa se render aos padrões tirânicos de beleza, cada qual é bonita do seu jeito. Devem aprender a cuidarem-se e amarem-se.

Tem a mulher que trabalha fora e a mulher que trabalha em casa. Tem a mulher que quis ser mãe e a mulher que optou por não ter filhos. Tem a mulher que amamenta e a mulher que não teve leite ou optou por dar fórmula ao seu bebê. Toda mulher é especial. As escolhas são pessoais ou casuais, mas a mulher se cobra demais.

Toda escolha implica perdas, e acredito que a mulher não lida muito bem com isso.

As cobranças são tantas: ser uma ótima profissional, uma ótima mãe, uma ótima esposa, uma ótima amiga, uma ótima filha, passear, estar linda, com suas idas ao salão de beleza e à academia. Mas daí não dá tempo. No fim do dia está cansada e não conseguiu fazer tudo queria.

Temos que deixar de lado o trivial, para viver e fazer o essencial.Escolher as nossas prioridades e o momento ideal. Procurar viver cada fase da vida plenamente, mas de forma leve. A mulher pode ser intensa e leve ao mesmo tempo, mas para isso precisa fazer escolhas. Permitir-se relaxar e poder contar com a ajuda das pessoas queridas.

A mulher pensa no bem estar da família e da sociedade como um todo. Pensa mais no coletivo no que no individual, por isso enxerga uma organização de forma mais ampla, de modo que a mulher é uma excelente gestora. Há tanta coisa que se contemplar na mulher, pois cada uma é um universo cheio de detalhes e cuidados.

Podemos lembrar aqui a professora Heley Abreu, que teve seu corpo quase todo queimado e deu sua vida para salvar seus alunos, naquela tragédia na cidade de Janaúba, Minas Gerais.

Temos tantas mulheres guerreiras, professoras, empregadas domésticas, cuidadoras do lar, médicas, advogadas, escritoras, jornalistas, missionárias, fazendeiras, empresárias, servidoras públicas e tantas outras.

A mulher não compete com o homem. A mulher soma, acrescenta. Cada um tem o seu papel. A mulher tem características específicas, a delicadeza, a capacidade de ouvir, de acolher. A mulher moderna não precisa ter medo de ser feminina. Pode ser uma ótima profissional e ainda assim preservar sua feminilidade. O respeito é uma questão de caráter e não de gênero.

As abordagens trazidas aqui têm o objetivo de, apesar de tantos enfrentamentos, estigmas, preconceitos, desigualdades, deixar claro que as mulheres são únicas e insubstituíveis. As mulheres fazem a diferença em tempos difíceis. As mulheres têm um papel de suma importância no restabelecimento da vida após o caos. As mulheres são poetisas por excelência e não devem desistir jamais.



[1] Bianca Rosenthal é advogada, especialista em Direito do Trabalho, escritora, poetisa, autora dos livros “Criando Janelas Light – Sob a ótica do aprendiz”, “Retrato de Uma Mulher Refeita – Metamorfoses” e “Profissões – Novos Rumos e Homenagens”, palestrante e estudiosa da gestão da emoção. E-mail: bianca@mraa.com.br

[2] Provérbios 14:1, Livro Sagrado

[3] Rosenthal, Bianca. Retrato de Uma Mulher Refeita – Metamorfoses / Bianca Rosenthal – São Paulo: Chiado Books, 2019

[4] Consulte o site: www.cvv.org.br

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