ONDE ESTAVAM OS DIREITOS DO LUIZ
Onde estavam os direito do Luiz?
Luiz Carlos Cancellier de Olivo, de currículo invejável, professor universitário, dentre seus méritos, o que mais lhe dava orgulho.
Luiz da Silva Lemos, homem simples, trabalhador, com pouca instrução, mas tão integro e honrado quanto o professor Cancellier.
Aparentemente não existe nenhuma relação entre os dois Luiz, mas ambos foram injustiçados, foram vítimas de abuso de autoridade, vítimas da espetacularização do processo penal.
O professor Cancellier foi preso preventivamente, teve a prisão revogada, contudo, foi proibido de entrar no seu local de trabalho, local onde se formou e formou muitos. Foi preso – na verdade – para satisfazer a necessidade do espetáculo, não resistiu e sucumbiu à vergonha causada pela injustiça, morreu, em suas palavras, quando foi banido da universidade – seu reduto, sua casa -.
O mecânico funileiro Luiz da Silva, o Luigi, acusado de estuprar e matar uma conhecida, foi detido em Osasco/SP, foi trazido para Sarandi/PR com as mãos e os pés algemados, uma viagem de 8 (oito) horas dentro de um camburão da polícia, viagem privada não só de conforto, mas sobretudo de dignidade.
Aqueles detentores da sanha acusatória dirão, se não devia, por que fugiu?
Luigi – como os amigos chamavam Luiz da Silva Lemos – não fugiu! Saiu da cidade pois estava sendo ameaçado de morte. Após o crime, pessoas próximas a vítima propagaram à multidão perplexa com a barbárie, que o autor seria ele, pois segundo estas pessoas ele vinha assediando a vítima, – mentira, testemunhas irresponsáveis! -.
E pasmem, a polícia ao invés de investigar as ameaças contra Luiz, preferiu imputá-lo a culpa, justificando sua saída da cidade. Em entrevista à impressa, o delegado de polícia chegou a dizer que o trabalho da polícia seria ligar o suspeito ao crime, patética investigação às avessas.
Luiz, o funileiro, foi preso por força da decretação de sua prisão temporária, teve esta ao final dos 30 primeiros dias a renovação, sob o fundamento da necessidade da investigação, da colheita de provas e para garantir que não se evadisse do distrito da culpa.
Ficou 47 dias preso injustamente. Já no primeiro dia, solicitado a fornecer material para o exame de confronto genético, não hesitou, queria provar sua inocência. Trabalhador, pai de uma menina de 4 anos, primário, nunca sofreu sequer uma abordagem policial, possuidor de residência fixa, nenhuma destas condições foram suficientes para contrapor a necessidade da prisão pela imprescindibilidade da investigação.
Seu drama teve término com a prisão de Francisco de Tal, em outra cidade, que confessou ser o autor do crime.
Saliente-se que do dia que teve seu direito à liberdade tolhido até o dia que saiu da prisão, ainda não havia sido interrogado.
Tanto Cancellier, quanto Silva Lemos, tiveram suas vidas destruídas, foram humilhados e massacrados pela opinião pública, condenados pelos milhões de juízes das redes sociais. Tamanha a vergonha, o professor universitário tirou a própria vida. O funileiro, pensou em fazer o mesmo, não fez, aguardou aquela que Rui Barbosa classificou com injustiça qualificada e manifesta.
O atual cenário vivenciado pela sociedade brasileira é de cristalina crise democrática, não há estabilidade, o aumento na criminalidade tem sido explorado pela imprensa, criou-se a “cultura do medo”, discursos odiosos e brados punitivistas ganham seguidores e publicidade, propalando opiniões vazias de qualquer ponderação jurídica e desprovidas de garantias e direito constitucionais.
Essa cultura justiceira está destruindo o Estado Democrático de Direito, pois tem distanciado os magistrados dos limites da lei, quando os influencia.
Frente ao clamor social pela ilimitação do poder, principalmente o de suprimir a liberdade, o que se espera do Estado e de seus representantes é o estrito cumprimento da legislação, pois a lei está acima de tudo e de todos, inclusive, e especialmente, dos operadores desta e da justiça.
Quem não é submisso à lei, não é convalidado à aplica-la.
Quando um advogado luta pela estrita aplicação legal e pelo respeito a garantias e direitos fundamentais, opõe-se ao mais bárbaro dos crimes, o cometido pelo Estado que quando exercendo seu poder, não se refreia diante do direito posto pelo próprio.
Tal qual a impunidade, o esquecimento das garantias e direitos fundamentais, não é interessante a qualquer Estado de Direito, pois para que este Estado tenha legitimidade para aplicação do jus puniendi, os fins não podem justificar os meios, o respeito e aplicação correta da norma é que legitima o exercício do poder.
Enquanto os operadores da lei, em especial aqueles que devem aplicá-la e mais, guardá-la, sucumbirem aos anseios populares que justificavam a renuncia à liberdade em prol da segurança, não haverá segurança jurídica, e todos estaremos sujeitos à pior das ditaduras, a judiciária.
Emerson Rogério de Oliveira Farias
Advogado Criminalista, membro e Representante da ABRACRIM – Maringá/PR, Secretário da Comissão de Advogados Criminalistas da Subseção da OAB/Maringá – PR, Vice-Presidente da Comissão de Advogados em Início de Carreira da da Subseção da OAB/Maringá – PR.