Quando e como utilizar a revisão criminal?
A revisão criminal é uma ação autônoma de impugnação de competência originária dos tribunais. Tem o objetivo de rever decisão condenatória com trânsito em julgado, em decorrência de algum erro judiciário.
Ela está embrionariamente prevista no art. 5º, LXXV, Constituição Federal: “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Trata-se de um dispositivo constitucional que, conquanto se refira ao caráter indenizatório, também pode ser lido no sentido de que os erros judiciários não podem perdurar.
A revisão criminal, o polo passivo terá o Estado, com o Ministério Público atuando na função de “custos legis” (art. 625, §5º, do Código de Processo Penal).
Como é sabido, o trânsito em julgado da sentença condenatória é requisito indispensável para o ajuizamento da revisão criminal, havendo jurisprudência que nem mesmo admite a justificação criminal quando houver pendência de recurso.
Também se deve considerar a sentença absolutória imprópria (a que impõe ao condenado medida de segurança), único caso em que é cabível a revisão de sentença de absolvição.
Tendo em vista que a revisão criminal atinge a coisa julgada, que é constitucionalmente protegida, considera-se que o rol do artigo 621 do CPP é taxativo:
Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I – quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II – quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III – quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.
Quando a decisão desfavorável contrariar o texto expresso da lei penal (art. 621, I, do CPP), deve-se interpretar incluindo as decisões contrárias à lei processual penal. Assim, não se deve limitar ao Direito Penal material.
Ademais, precisa haver afronta ao texto da lei, e não apenas divergência na sua interpretação. Sobre o tema, insta citar a súmula n. 343 do Supremo Tribunal, que afirma: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.”
Outra hipótese de cabimento diz respeito aos depoimentos, exames ou documentos falsos (art. 621, II, do CPP). Não é qualquer alegação/suspeita de fraude que fundamenta a revisão criminal. O ideal seria apurar detalhadamente o falso testemunho, a falsa perícia ou a falsidade documental.
Quanto às novas provas da inocência, elas podem abranger tanto autoria, quanto materialidade. Se as provas inéditas, surgidas após a sentença condenatória, inocentarem o réu, é cabível a revisão criminal. Destaca-se que não é possível a reapreciação da prova já examinada no processo anterior, considerando que deve ter um caráter de novidade.
Além dos fundamentos para a revisão criminal, insta refletir sobre as situações de seu cabimento.
De início, observa-se que é cabível a revisão criminal ainda que tenha ocorrido a extinção da punibilidade (prescrição, por exemplo) ou da pena, nos termos do art. 622 do CPP. Isto porque a extinção da pena não impede a consideração dos maus antecedentes. Também é admissível após o cumprimento da pena, mesmo que o condenado tenha sido indultado.
O entendimento majoritário é de que não cabe revisão criminal de sentença concessiva de perdão judicial, haja vista o teor da súmula n. 18 do STJ: “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”. Noutras palavras, inexistindo efeitos condenatórios, não existiriam motivos para a revisão da decisão.
Contra as decisões proferidas pelo Juizado Especial Criminal, cabe a revisão criminal. Todavia, entende-se que a decisão deverá ser revisada no âmbito das Turmas Recursais.
Quanto aos efeitos da revisão criminal, salienta-se que é vedado o agravamento da pena, somente pode ser acolhida a revisão para melhorar a situação do condenado.
Por fim, é imperioso reconhecer que há uma responsabilidade objetiva do Estado em caso de procedência da revisão criminal (art. 5.º, LXXV, da Constituição). Dessa forma, como consequência da revisão criminal, pode ser proclamado o dever do Estado de indenizar o condenado.
Nesse sentido, duas decisões interessantíssimas:
[…] REVISÃO CRIMINAL. PROVA NOVA. EXCLUSÃO DE PATERNIDADE. SUA APTIDÃO PARA DESCONSTITUIÇÃO DA CONDENAÇÃO POR ESTUPRO. PENA JÁ CUMPRIDA. DEVER DO ESTADO DE INDENIZAR. […] Prova nova, assim, consistente no teste de DNA que afastou paternidade, com aptidão para desconstituir os alicerces da condenação. Revisão acolhida, para proclamação de desconstituição da condenação e afirmação do dever do Estado de indenizar. (TJ/RS, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, Revisão Criminal Nº 70012499000, Rel. Marcelo Bandeira Pereira, julgado em 28/04/2006)
[…] TENDO EM VISTA QUE A REVISÃO CRIMINAL DESCONSTITUIU A SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA IMPOSTA CONTRA O APELADO, RESTOU CARACTERIZADA A RESPONSABILIDADE DO ESTADO. QUANTIFICAÇÃO DO DANO DENTRO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. […] (TJ/SE, Primeira Câmara Cível, Apelação Cível nº 201200203018, Rel. Suzana Maria Carvalho Oliveira, julgado em 10/07/2012)