Razões recursais previstas no CPP são incompatíveis com celeridade
É válida a decisão do juiz de primeira instância que, para neutralizar a lentidão processual, deixa de aplicar o parágrafo 4º do artigo 600 do Código de Processo Penal sob o fundamento de sua não recepção pela Constituição Federal. A decisão é da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, seguindo voto do relator, desembargador Celso Jair Mainardi.
O dispositivo diz que, se o apelante declarar, na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na superior instância, serão os autos remetidos ao tribunal ad quem onde será aberta vista às partes, observados os prazos legais, notificadas as partes pela publicação oficial.
Para o desembargador Celso Mainardi, não há mais razão para esse dispositivo existir no CPP. “A realidade do mundo hodierno, especialmente com a concretização do processo eletrônico e, do já antigo, protocolo judicial integrado, onde o advogado pode protocolizar as suas razões de recurso de apelação sem a necessidade de deslocamento da comarca ou, sequer, sair de seu escritório, comprova que a vigência do referido dispositivo é absolutamente desarrazoada”, afirma.
O relator lembra que o dispositivo foi introduzido no CPP em 1964 porque naquela época existia limitação do contingente de advogados atuantes em regiões distantes das sedes dos tribunais, de modo que a possibilidade de apresentar razões diretamente em segunda instância beneficiava o direito de defesa do sentenciado.
“Sob esse enfoque, nota-se claramente que, hoje em dia, o referido dispositivo teve a sua razão de existir esvaziada, consubstanciando um óbice à efetivação da duração razoável do processo e projetando efeitos catastróficos à delicada situação econômica atual, porquanto aumenta injustificadamente os custos do processo para o Estado”, afirmou o relator.
O próprio magistrado, em decisão monocrática, já havia explicado porque considera que a incidência do artigo acarreta prejuízo ao erário e à jurisdição.
“Recebido o recurso no Juízo a quo, a secretaria encaminha o processo, digitalizado, em CD, para o Tribunal de Justiça. Depois de distribuído, o relator intima o defensor, pela imprensa oficial, para que veicule as razões. Com elas, o processo (uma parte digitalizada e outra em meio físico, já que a apelação tramita em papel na segunda instância) retorna à origem, para que o Ministério Público e, se houver, a assistência de acusação ofereça contrarrazões. Para tanto, porém, a secretaria digitaliza a parcela física do feito e, via Projudi, abre prazo para a resposta ao recurso. Na sequência, ‘exporta’ o processo novamente, gravando-o em mídia, mais uma vez, a fim de que seja, de novo, enviado ao Tribunal. Esse procedimento custa muito. Exige o trabalho de servidores, estagiários e magistrados, de primeira e segunda instância, com aplicação de dinheiro público (remuneração dos envolvidos e gastos com material de expediente e correio). Não bastasse — e aqui o fator mais importante —, esse vai-e-volta do processo atrasa a entrega da tutela jurisdicional, já que essa sistemática, na prática, demora meses. Traz, ainda, prejuízo incalculável ao próprio réu, notadamente se estiver preso ou com ordem de prisão pendente”, explica.
Assim, seguindo o voto do relator, a 4ª Câmara Criminal do TJ-PR concluiu que é inaplicável o disposto no artigo 600, parágrafo 4º, do CPP por total incompatibilidade com o princípio da razoável duração do processo.
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