SERVIDOR PÚBLICO PODE PERDER O CARGO ANTES DE ENCERRADA A CONDENAÇÃO JUDICIAL?
SERVIDOR PÚBLICO PODE PERDER O CARGO ANTES DE ENCERRADA A CONDENAÇÃO JUDICIAL?
Por LUCAS RODRIGUES ALVES¹ e MAICON JOSÉ ANTUNES²
Os crimes praticados por funcionários públicos sempre resultam em uma dúvida recorrente, a qual consiste na seguinte pergunta: mas se eu for condenado eu perderei o cargo público? Se sim, quando?
A resposta para esse tipo de questionamento não é nenhum um pouco simples.
Isso porque a decretação da perda do cargo público, no âmbito do Código Penal, é regulada pelo art. 92, que dispõe o seguinte:
Art. 92 – São também efeitos da condenação
I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;
b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.
Parágrafo único – Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.
Como se pode perceber, a princípio, não há nenhuma consideração relacionada ao tempo que será executada essa pena descrita como acessória. Aliás, o Código de Processo Penal considera ainda que os recursos às Cortes Superiores não possuem efeito suspensivo, consoante se depreende do disposto no art. 637 “o recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença“.
A partir disso, a pena acessória (perda do cargo) também deve ser executada e os pagamentos a título de remuneração cessados antes de uma condenação encerrada?
Ao nosso ver, a resposta é não.
Em primeiro lugar,a interpretação infraconstitucional – independente da área do direito – deve-se apoiar nos fundamentos e nas disposições do Direito Constitucional e não o contrário.
A partir disso, tem-se, claramente que, embora os recursos para as Cortes Superiores não possuam, em regra, efeito suspensivo, a execução das penas acessórias de perda do cargo e inabilitação para o exercício de cargo ou função pública fica condicionada à existência de condenação definitiva [1]. Portanto, não é possível sustentar a possibilidade da execução da pena acessória enquanto há pendência de julgamento dos recursos para as Cortes Extraordinárias. [2]
Até porque, além disso ser uma afronta ao princípio da presunção da inocência, a Constituição Federal possui um rol taxativo no que diz respeito à possibilidade da perda do cargo em virtude de sentença judicial nos casos de servidores estáveis, senão vejamos:
Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.
§ 1º O servidor público estável só perderá o cargo:
I – em virtude de sentença judicial transitada em julgado;
Nesse mesmo sentido, é o posicionamento das 5ª e 6ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça, no que se refere à execução provisória das penas acessórias, quando não há a certificação do trânsito em julgado da sentença penal, não havendo que se falar, portanto, na aplicação imediata do art. 637 do CPP no que se refere a estas penas.
De mais a mais, sustentar essa possibilidade de perda do cago – sem a certificação do trânsito em julgado -, trata-se, claramente, de analogia in malam partem do papel dos recursos interpostos perante as Cortes Superiores, o que é vedado pelo Direito Penal.
Em todos os casos, para verificar melhor a situação concreta procure o auxílio de um especialista na área.
[1] (STJ, Medida Cautelar n. 15.679/SP, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. em 4/12/2009)
[2] (STJ, Habeas Corpus n. 98.627/RS, rel. Min. Og Fernandes, 6ª Turma, j. em 18/12/2008)
¹Associado da Baratieri Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-graduando em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Membro Consultivo da Comissão de Direito Penal e da Advocacia Criminal OAB/SC. Membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM). Ex-estagiário na 16ª Procuradoria de Justiça Criminal do Ministério Público do Estado de Santa Catarina e na 6ª Delegacia de Polícia de Capital (SC) – Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI).
²Sócio da Baratieri Advogados. Bacharel em Direito pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina – CESUSC/Florianópolis. Especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo Complexo Damásio de Jesus. Membro da Comissão de Direito Militar da OAB/SC, da Comissão de Direito do Servidor Público e da Comissão de Direito Previdenciário – regime próprio. Membro do Instituto de Direito Administrativo de Santa Catarina – IDASC. Professor dos cursos de atualização e aperfeiçoamento do Portal Gestão Pública Online, na área de Licitações e Contratos Administrativos, de Servidor Público e de Processo Legislativo. Consultor do Portal Gestão Pública Online. Sócio do Escritório Baratieri Advogados Associados e da empresa Gestão Pública Online.