Você não escolhe a advocacia criminal, ela quem te escolhe, você precisa apenas estar vocacionado para essa profissão e ser resiliente
Rosimeire da Silva Meira
Sim, eu não escolhi ser advogada criminal, foi a advocacia criminal quem me escolheu, estava vocacionada para ela, quando nem mesmo sabia o que significava advogar na área criminal. Vou compartilhar com vocês como cheguei na advocacia criminal e como tive certeza que estava na profissão certa.
Espero que esse pequeno texto ajude aqueles que ainda estão começando ou até mesmo aqueles que já estão, de certa forma, aprimorados nessa área, mas que ainda precisam olhar para si próprio e acreditar que, por algum motivo, foi escolhido para estar nessa profissão.
Pois bem, no ensino médio eu sempre fui uma aluna mediana, aliás, do ensino fundamental até a conclusão do curso de direito, eu nunca fui a melhor da turma, mas em física e matemática eu era boa, até ajudava os colegas da turma com aulas de reforço.
Diferente de muitas pessoas, que desde muito cedo pensam na profissão que querem seguir, eu não tinha noção nenhuma do que queria ser na vida. Cursar uma faculdade, ainda mais de direito, jamais tinha passado pela minha cabeça, curso de Direito era para os “ricos” e “inteligentes”, eu era pobre e aluna mediana, que sempre estudou em escola pública. Porém, desde muito nova carregava dentro de mim uma sede imensa de justiça ou melhor dizendo, de “justiçamento”.
Não muito tempo atrás, tive o imenso prazer de assistir um colega tribuno que muito admiro, Dr. Matheus Menna, explicar aos jurados, em uma sessão plenária, a diferença de justiça e justiçamento, dizia ele: “O justiçamento é a resposta sumária, de vindita, para não raro satisfazer os anseios daqueles abutres da desgraça alheia, os quais cada vez mais reivindicam dor e sofrimento. A justiça não. A justiça é serena. A justiça tem sua marcha. A justiça tem o seu ritmo. Porque senão não era necessário um promotor que acusa e um advogado que defende. Senão não era necessário recrutarmos sete pessoas da sociedade, retirá-las de seus afazeres diários, para virem aqui: fazer justiça!”
Eu buscava, naquela época, como a maioria dos leigos, justiça em forma de “justiçamento”, uma forma de trazer mais dor, mais sofrimento, mais privação de liberdade para aquele que havia cometido um delito e
recebido, ao meu ver, uma pena branda.
Sem saber o que queria ser, quando estava concluindo o ensino médio, me inscrevi no vestibular para Ciências Contábeis, era boa em números, gostava de números. Porém, lá no inconsciente minha sede de
“justiçamento” gritava para que eu me inscrevesse também no vestibular para Direto, para ajudar a fazer “justiça”, me inscrevi.
Passei no vestibular, em primeira chamada, para Ciências Contábeis, fiz minha matrícula no curso e estava aguardando o início das aulas, quando fui chamada, na repescagem da repescagem, para o curso de
Direito, larguei tudo e cursei Direito como bolsista, no maior perrengue.
Já nas primeiras cadeiras da faculdade vi que a justiça, que eu buscava incessantemente, já tinha sido feita, e o que eu estava desejando era na verdade o justiçamento. Entretanto, dentro do devido processo legal não há lugar para justiçamento. No processo penal, “a justiça é serena. A justiça tem sua marcha. A justiça tem o seu ritmo”.
Sem muitas opções, bolsista naquela universidade, prossegui no curso, mudar iria me atrasar muito. Eu até gostava do direito penal, mas odiava o processo penal. Nunca me interessei pela área. Pelos corredores haviam rumores que o professor de processo penal era “meio louco”. De fato, ele era estranho, falava tão alto, que as vezes até gritava, contava casos de clientes homicidas com tanto prazer, com tanto amor, que realmente parecia um louco. Ele era um admirável tribuno, mas àquela época eu não entendia.
Eu gostava era de direito de família, a professora era um doce, falava calmo, baixo, ela era adorável. Minha monografia fiz em direito de família, era encantada por esse tema, estagiava no Ministério Público na promotoria da família.
Quando me formei tive que me desligar do estágio, por questões financeiras comecei a advogar de forma autônoma na área cível, usava o espaço da CAASC para jovens advogados, precisava de dinheiro, por falta de opção, tinha que advogar, não tinha tempo para estudar para concursos.
No ano seguinte, comecei a trabalhar em um grande escritório que advogava para seguradoras, até que consegui uma boa oportunidade de trabalho, no setor jurídico de uma contabilidade, eu gostava da área, mas foi ali que tudo mudou, que a advocacia criminal me encontrou.
Certo dia, estava eu fazendo minhas cobranças de taxas de condomínio (essa era minha função, cobrar e ajuizar ação contra os condôminos inadimplentes), quando notei que a faxineira do escritório chegou cabisbaixa, com os olhos cheios de lágrimas e, enquanto torcia o pano de chão no balde, me contou que seu irmão havia sido preso com drogas, que toda família estava sofrendo muito, mas que não tinham como contratar um advogado.
Eu que jamais havia atuado nessa área, que repudiava os criminosos, me vi ali, diante daquela situação, sem saber muito o que falar, mas sabendo que, de alguma forma, eu poderia fazer a diferença na vida daquela pessoa que já tinha uma vida tão sofrida, então resolvi ajudar.
Peguei a procuração com o cliente no antigo cadeião do estreito (lugar no mínimo insalubre), busquei o processo no fórum (era físico), vi que já havia sido negada a liberdade provisória, estudei a matéria e fiz o meu primeiro Habeas Corpus, pedido de nome tão estranho, que só havia ouvido falar nas cadeiras da Univali. Um dia depois do protocolo, para minha surpresa, foi concedida a liminar, o que senti foi uma sensação indescritível, um sentimento que não existem palavras para explicar.
Um dia desses, minha sócia Dra. Andreza Rodrigues, que iniciou a carreira recentemente atuando na área previdenciária, mas que está aceitando nomeações em processos criminais, me fez relembrar desse
sentimento tão indescritível quando me mandou a seguinte mensagem, “sentença absolutória para o menino ali do caso do carro, que felicidade no coração, estou até chorando, imagina, que sensação engraçada, louco isso, muito bom a sensação”. Ela não conseguia descrever o que estava sentindo
e foi exatamente isso que eu vivi e que me fez ter a certeza que ela também está vocacionada para essa área, embora tenha iniciado a carreira aposentando pessoas, ela está vocacionada para advocacia criminal.
Existem pessoas que desde a faculdade já sabem o que querem ser, a exemplo do meu marido e sócio que tanto admiro, Dr. Eduardo Dalmedico Ribeiro. Ele sempre quis ser advogado criminal, ele quer ser um
grande tribuno, ele será, tenho certeza disso. Mas existem outras pessoas, assim como eu, que, somente quando viverem essa emoção, saberão que encontraram o seu caminho.
Se você sentiu algo que não consegue sequer descrever quando teve seu primeiro resultado positivo na advocacia criminal, você está no caminho certo e as coisas irão fluir, acredite, basta olhar para si próprio e
confiar.
Haverá muitos percalços no caminho, o julgamento das pessoas que acreditam que o advogado criminal defende bandido (essas pessoas não sabem a diferença de justiça e justiçamento) e, também haverá a sua própria frustração diante dos inúmeros resultados negativos, que não serão poucos.
Porém, tudo será recompensando quando você sentir que seu trabalho fez diferença na vida de alguém, que por meio de você, a justiça foi feita na vida de um semelhante. E, no caminho, você também conhecerá colegas de profissão que se tornarão grandes amigos.
Portanto, seja qual for a fase em que você se encontra, não desista. A única razão para você desistir da advocacia criminal é se você for indiferente quanto a conseguir um bom resultado ao seu cliente (seja
restabelecendo a sua liberdade ou conseguindo uma sentença absolutória).
Do contrário, seja resiliente e feliz na advocacia criminal.
Rosimeire da Silva Meira