COMBINAÇÃO ACEITA – Dolo eventual é compatível com qualificadoras objetivas do homicídio
As qualificadoras objetivas do crime de homicídio, previstas nos incisos III e IV do parágrafo 2º do artigo 121 do Código Penal (CP), são compatíveis com o dolo eventual. Esse entendimento foi estabelecido por unanimidade pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o caso de uma policial civil do Paraná acusada de homicídio.
De acordo com o colegiado, “as referidas qualificadoras serão devidas quando constatado que o autor delas se utilizou dolosamente como meio ou como modo específico mais reprovável para agir e alcançar outro resultado, mesmo sendo previsível e tendo admitido o resultado morte”.
Segundo a acusação, a policial civil, que estava fora de serviço, ficou incomodada pelo barulho de uma festa na vizinhança e disparou sua arma para espantar os participantes, atingido mortalmente um deles. Ela foi denunciada pelo Ministério Público do Paraná por homicídio com dolo eventual triplamente qualificado (motivo fútil, recurso que dificultou a defesa da vítima e perigo comum).
A sentença de pronúncia afastou as qualificadoras e determinou a submissão da ré ao júri popular pela acusação de homicídio simples (artigo 121 do CP, caput) com dolo eventual.
Ao manter a sentença, o Tribunal de Justiça do Paraná entendeu que a alegação de motivo fútil se confundia com a justificativa do dolo eventual, caracterizando bis in idem, que a qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima “não se compatibiliza com o dolo eventual” e que não haveria indícios para sustentar a do perigo comum.
Coexistência admitida
No entanto, o relator do caso no STJ, ministro Joel Ilan Paciornik, lembrou que a jurisprudência da corte admite a coexistência do dolo eventual e das qualificadoras subjetivas (por exemplo, o motivo fútil). Ele mencionou decisão recente em que a 6ª Turma estabeleceu “não ser incompatível a qualificadora do motivo fútil com o dolo eventual, pois o dolo do agente, direto ou indireto, não se confunde com o motivo que ensejou a conduta capaz de colocar em risco a vida da vítima”.
No entanto, o magistrado ressaltou que há controvérsia no STJ em relação às qualificadoras objetivas, situação que também se verifica no Supremo Tribunal Federal, embora lá os julgados mais recentes sejam pela compatibilidade.
De acordo com Paciornik, as decisões que concluem pela incompatibilidade das qualificadoras objetivas se fundamentam na percepção “de que o autor escolhe o meio e o modo de proceder com outra finalidade, lícita ou não, embora seja previsível e admitida a morte”.
Para o relator, “tal posicionamento retira definitivamente do mundo jurídico a possibilidade fática de existir um autor que opte por utilizar meio e modo específicos mais reprováveis para alcançar fim diverso, mesmo sendo previsível o resultado morte e admissível a sua concretização”.
Além disso, segundo o ministro, a justificativa para a incompatibilidade entre o dolo eventual e as qualificadoras objetivas — que seria a inexistência de dolo direto para o resultado morte — se choca com a posição do STJ de considerar o dolo eventual compatível com “motivo específico e mais reprovável” para o crime, representado pelas qualificadoras subjetivas dos incisos I e II do parágrafo 2º do artigo 121.
Assim, a 5ª Turma acolheu o pedido do Ministério Público para reincluir as qualificadoras na pronúncia, à exceção do perigo comum, pois o tribunal estadual não reconheceu nos fatos os pressupostos para a sua caracterização. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
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REsp 1.836.556
Conjur