IV ENAC – “A investigação dos crimes econômicos não se preocupa mais com a autoria”, afirmou Helena Lobo
O IV Encontro Nacional das Advocacia Criminalistas (IV Enac), realizado no último dia 22, no Costão do Santinho, em Florianópolis/SC, além da abertura com integrantes da presidência da Abracrim Nacional e Aacrimesc, iniciou com o painel “Direito Penal Econômico”.
Na abertura do IV Enac, foram convidados à mesa de honra, Elias Mattar Assad (presidente da Abracrim Nacional), Sheyner Asfóra (vice-presidente da Abracrim Nacional), Ana Paula Trento (presidente da Abracrim Mulher), Olívia Castro (vice-presidente da Abracrim Mulher), Renato Boabaid (presidente da Abracrim/SC), Adriana Spengler (vice-presidente da Abracrim/SC), Deivid Prazeres (presidente da Aacrimesc), Cláudia Prudêncio (presidente da OAB-SC), Maria José Gomes e José Manoel Soar (Dr. Jaraguá), integrantes e presidentes estaduais da Abracrim Mulher.
Sheyner Asfóra, em seu discurso de abertura, saudou a todos e parabenizou o trabalho da comissão Abracrim Mulher. “É com muita honra que participo deste VI Encontro Nacional das Advogadas Criminalistas. Fica aqui o meu respeito às diretoras e presidentes estaduais da Abracrim Mulher, comissão essa que muito faz e muito fará em nome de todas as advogadas e em nome de toda a Abracrim Nacional. Quero registrar os parabéns a todas, pois sou testemunha do grande trabalho que é realizado, trabalho este que fomenta e cresce cada vez mais em representatividade. A Abracrim Mulher é referência em todo o país”, disse.
Já Ana Paula Trento, estava radiante com o início do encontro e afirmou que a Abracrim é uma família. “Que felicidade! Nós da Abracrim, somos uma família. E hoje, lançamos a nossa primeira Revista Acadêmica da Abracrim Mulher, o que demonstra que mulheres escrevem sim, escrevem bem e escrevem sobre tudo. Portanto, digo à todas as mulheres criminalistas que não se sintam sozinhas, porque todas nós somos uma só. Nós somos luz e vela, não apenas para brilhar, mas também para iluminar umas às outras”, ressaltou.
Elias Mattar Assad, presidente da Abracrim Nacional naquele momento, foi singelo mas pontual em sua fala. “A Abracrim é uma obra de muitas mãos. “Enalteço neste momento, Ana Paula Trento, presidente da Abracrim Mulher. Viva a advocacia criminal feminina do Brasil!”.
Assim, deu-se início do primeiro painel, sob a temática “Direito Penal Econômico”, com a mesa composta por Ana Paula Trento, Fabrizio Bon Vecchio, Vilson Benayon, Rodrigo Cavalcanti, Luiz Eduardo D’Urso, Ana Carolina Warde, Olívia Castro, Natália Alves, e as palestrantes Helena Regina Lobo e Adriana Spengler.
Helena Lobo, professora da USP e advogada em São Paulo, iniciou seus apontamentos sobre as violações aos princípios fundamentais do direito que ocorrem no ramo do Direito Penal Econômico.
“Sobre o Direito Penal Econômico, digo que atualmente é neste âmbito do direito que têm se travado discussões muito importantes. É aqui que as maiores afrontas ao Princípio da Legalidade são feitas. Nós temos tipos abertos, tipos indefinidos, tipos que a doutrina aponta há muito tempo como inconstitucionais, mas que continuam no nosso sistema, continuam sendo aplicados, porque, afinal de contas, “nós” precisamos colocar colarinho branco na cadeia. Por exemplo, em muitos casos, se quer é possível identificar o bem jurídico tutelado.”
Ainda ressaltou sobre a inobediência do Princípio da Subsidiariedade. “Aqui diz que quando outros ramos do direito são suficientes para punir, para sancionar de forma eficaz uma determinada conduta, nós não devemos usar o Direito Penal. Nós temos, por exemplo, no âmbito do Direito Financeiro, o Banco Central atuando, no âmbito dos crimes tributários, a Receita Federal e as Fazendas Públicas atuando, autuando e impondo multas, muitas vezes altíssimas, no Direito Ambiental, a mesma coisa…Não existe nenhuma preocupação por parte, seja do legislador, seja do aplicador do Direito de estabelecer quando há suficiência por um outro ramo, nós sempre aplicamos sanção, processo, investigação duplicados, muitas vezes triplicados, quadruplicados, sobre tudo no âmbito da corrupção.”
Durante sua fala, Lobo ressalta a banalização das denúncias no âmbito do Direito Penal Econômico. “Nós estamos acostumados, há mais de 20 anos, a denúncias genéricas, que muitas vezes são chamadas de denúncias gerais para fugir da discussão central. Estamos nos acostumando às denúncias que decorrem da ocupação de uma posição dentro da empresa. Em crimes tributários, denúncias que se valem de cadastros junto ao órgão fazendário de quem seria o responsável tributário. Quando esse cadastro não reflete a realidade, quando não está mais atualizado…não importa. A pessoa é arrastada para o processo penal, porque na verdade, hoje a investigação policial, a investigação pelo Ministério Público desses crimes não se preocupa mais com a autoria, busca-se simplesmente a imputação de responsabilidade pela ocupação de uma posição. Foi-se o tempo em que o inquérito policial era considerado simplesmente um instrumento de investigação da tese estabelecida pelo delegado ou da tese estabelecida pelo promotor. O inquérito policial precisa servir também à defesa, porque a defesa constrói esse caminho que é a busca da verdade real dentro dos limites dos direitos fundamentais. Existem caminhos para a busca da verdade em um estado democrático de direito e faz parte desses caminhos, a contribuição da defesa, da advocacia”, enunciou.
Já a vice-presidente da Abracrim/SC naquele momento, Adriana Spengler, iniciou falando sobre as técnicas legislativas. “Eu tenho uma visão muito crítica sobre o Direito Penal Econômico e isso não vem por acaso, vem pela própria criação do Direito Penal Econômico no ordenamento jurídico brasileiro. Ele se deu no período de 15-17 anos de legislatura, porque havia um movimento internacional de criminalização de condutas do colarinho branco. A técnica legislativa, não por acaso, ela veio com crimes tipos abertos, normas penais em branco, crimes de perigo, tipos formais, e isso já destoa de uma certa forma da imputação como deve ser, dogmaticamente falando. Ou seja, a imputação vulnerabiliza.”
Adriana ainda relata sobre as dificuldades de se atuar em um processo nessa seara. “No Direito Penal Econômico é aonde mais temos uma dissonância cognitiva, pois inclusive, é muito comum uma série de medidas cautelares que vão sendo aplicadas, como por exemplo, interceptação telefônica, quebra de sigilo bancário, fiscal, por um bom tempo, já que a própria interceptação pode ser reiterada por um longo tempo, já que a própria lei não estabelece um prazo, somente uma fundamentação, a qual hoje em dia é muito básica…Então, quando o imputado toma conhecimento dessa acusação, é porque vem uma medida mais drástica, uma busca apreensão, uma prisão temporária. Só que aí, quando vê-se, já foi produzido um ano de prova. Aí, o advogado vai tomar conhecimento com todas aquelas restrições que sabemos, com dificuldade de ter acesso, pra poder fazer a defesa. Muito tempo depois. Então, já há um problema nesse sentido na advocacia criminal na seara econômica. Às vezes, o advogado só é chamado quando há o recebimento da denúncia, e isso é um grande problema. Mas a luta continua”, disse.
Fabrizio Bon Vecchio, advogado e presidente do Instituto Ibero-Americado de Compliance, encerrou a mesa falando sobre ativismo judicial e o lavajatismo. “A gente tem uma construção em cima de um período historicamente complicado e isso tudo foi amplificado pela deflagração da Operação Lava Jato. E isso acaba exigindo, de certa forma, uma resposta do Poder Judiciário – e não deveria ser dessa forma, ao anseio da população. E aí, talvez seja a grande falha, grande dificuldade, quando temos um judiciário que existe para dar respostas e não fazer o seu trabalho técnico. Nossa dificuldade é dar respostas às situação que não estamos preparados, porque não dependem de nós e que fogem da atividade jurídica, quando entra o ativismo. Isso tudo deve ser mudado de alguma forma, e nós só vamos conseguir mudar tudo isso com a nossa atuação diária”, finalizou.
***OS VÍDEOS DO VI ENAC ESTARÃO DISPONÍVEIS EM BREVE.
Nannah Ribas
ABRACRIM NACIONAL