Réu algemado sem fundamentação anula atos processuais
O réu só pode permanecer algemado na audiência se houver fundamentação escrita apontando resistência indevida, receio de fuga ou o perigo à integridade física das demais pessoas presentes. Com base neste entendimento, expresso na Súmula 11, do Superior Tribunal Federal, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sulanuloua condenação de um homem denunciado por estupro de vulnerável.
Após analisar as razões de Apelação, o colegiado acolheu as preliminares da defesa, dentre as quais a que pedia a nulidade do interrogatório do acusado, em face de ser apresentado algemado à audiência.Por consequência, todo o processo que resultou nacondenaçãodo réu — oito anos de reclusão em regime fechado — foi anulado. O juízo da Comarca de Taquari terá de abrir novo prazo para as alegações finais, retomando o curso da demanda.
‘‘Nos termos da Súmula Vinculante nº 11, deveria ter sido registrado no termo de audiência a efetiva fundamentação judicial para a manutenção do réu algemado durante o seu interrogatório, não apenas a apresentação de justificativa posterior ao ato, isto é, quando da sentença’’, observou, inicialmente, o relator do caso no TJ-RS, desembargador Francesco Conti.
Ele também apontou que não basta a mera alegação genérica de que o réu é perigoso. Ou seja, é preciso fundamentar e registrar em ata.Conti afirmou que, a teor do disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição, todas as decisões judiciais devem ser fundamentas sob pena de nulidade. Como a regra ‘‘foi quebrada’’ pela inexistência da fundamentação, nulo é o ato.
O desembargador ainda acolheu a segunda preliminar, de instauração de incidente de sanidade mental, que teria cerceado o movimento da defesa. “O juízo não precisa ter certeza da insanidade mental do réu (o que, por lógica, tornaria dispensável o exame); basta a dúvida, a qual se mostra presente a partir dos argumentos defensivos”, encerrou. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 5 de junho.
O caso (Conforme denúncia oferecida pelo Ministério Público estadual, o crime ocorreu no dia 6 de outubro de 2012, no distrito de Júlio de Castilhos, zona rural do município de Taquari (RS). O acusado foi flagrado por um vizinho quando abusava de sua própria sobrinha, de nove anos de idade.
A peça inicial do MP denunciou o homem a partir das sanções previstas no artigo 217-A, caput, do Código Penal — ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos — na forma da Lei Maria da Penha e da Lei dos Crimes Hediondos. Conforme Inquérito Policial, a vítima já havia sofrido abuso semelhante por parte do tio.
Preliminares (Antes de proferir a sentença, a juíza Cristina Margarete Junqueira, titular da Vara Judicial da Comarca de Taquari, teve de julgar as preliminares de nulidade suscitadas pela Defensoria: cerceamento de defesa — por indeferimento da instauração de incidente de insanidade — e uso abusivo de algemas durante a fase de interrogatório, o que viria a ferir a Súmula 11 do Superior Tribunal Federal.
No primeiro caso, a magistrada entendeu que os argumentos deveriam vir explanados por meio de recurso, o que não foi feito, ocasionando a perda do direito de agir nos autos. ‘‘Ademais, o réu não demonstrou conduta que justificasse a instauração do incidente pretendido, assim como não aportou aos autos qualquer atestado médico que indicasse fosse ele portador de alguma moléstia que pudesse fazer o juízo concluir pela sua inimputabilidade’’, complementou.
Quanto à segunda preliminar, disse que o fato também deveria ter sido arguido no momento da audiência de interrogatório. Além do quê, não foi consignado em ata nenhum pedido para retirar as algemas do acusado.‘‘No caso concreto, a manutenção das algemas no acusado justifica-se pela falta de segurança no local, anotando que os agentes da Susepe [Superintendência dos Serviços Penitenciários] entenderam ser necessária a mantença da restrição no acusado como forma de garantir a segurança dos presentes à sala de audiência’’, justificou.
O acusado acabou condenado, nos termos da denúncia, à pena de oito anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado. Ele também foi condenado a pagar, a título de indenização, um salário mínimo à vítima. Por conta da gravidade da conduta, o juízo local não lhe concedeu o direito de apelar em liberdade.
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FONTE: WWW.CONJUR.COM.BR